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Inmetro e BNDES transformam boas práticas empresariais e responsabilidade social e ambiental em juros de financiamento mais baixos ou facilidades para obtenção do crédito.

Um acordo de cooperação técnica firmado, na última sexta-feira, entre Inmetro e BNDES pode transformar a adoção de práticas empresariais social e ambientalmente responsáveis em juros de financiamento mais baixos ou facilidades para obtenção do crédito. Induzir a boas práticas, um dos objetivos do acordo, também é a motivação do Fórum Governamental de Responsabilidade Social, que será instalado quarta-feira, em Brasília. Reunindo diversos segmentos do governo, o fórum pretende pensar políticas públicas que promovam a responsabilidade socioambiental nas empresas.

O acordo entre Inmetro e BNDES prevê parceria em várias áreas — como etanol e produção de alimentos —, mas o tema mais avançado até agora é a criação de critérios para avaliar a sustentabilidade de processos produtivos. Ou seja, práticas que levam em consideração os impactos econômico, social e ambiental, antecipa Gustavo Kuster, chefe da Divisão de Programas de Avaliação de Conformidade do Inmetro:

— Até julho, devemos pôr os critérios em consulta pública. Posteriormente, pensamos em elaborar anexos com critérios setoriais, que permitam a avaliação mais precisa do impacto provocado pelas empresas.

 

Idec: é preciso buscar resultados concretos para o consumidor

 

Já o fórum, capitaneado pelo Inmetro, é formado por representantes de diversas instâncias do governo — desde o Banco Central, passando por Dataprev, Anatel, Câmara dos Deputados até ministérios como do Meio Ambiente e do Planejamento. Alfredo Lobo, diretor de Qualidade do Inmetro, explica que o governo quer exercer um papel de liderança no tema:

— Com políticas públicas, sejam regulamentos, instruções normativas ou campanhas, queremos ampliar o movimento de responsabilidade socioambiental no Brasil.

 

O Inmetro está discutindo novos critérios para a certificação como a de gestão socialmente responsável, que tem hoje 21 empresas certificadas e dez em processo de certificação. O objetivo principal da revisão, criada em 2004, a NBR 16001, é avançar na avaliação da responsabilidade social, ambiental e econômica das empresas.

— Fomos pioneiros no mundo nesse tipo de certificação e o que buscamos agora é dar mais clareza aos critérios de avaliação, de forma a obter dados mais concretos, mais exatos. Queremos reduzir a subjetividade da avaliação. Além disso, vamos começar a estudar o alinhamento a ISO 26000, norma de responsabilidade social internacional, da qual o Brasil, com sua experiência, teve grande participação na elaboração — afirma Lobo.

 

Coordenadora-executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Lisa Gunn, vê como positiva todas as iniciativas, mas se preocupa com a efetividade dessas ações:

 

— A NBR 16001 ajuda a empresa a internalizar a responsabilidade social. Mas não é uma avaliação de desempenho. Ter uma gestão responsável não quer dizer que a empresa é socialmente responsável. São coisas diferentes. A parceria entre Inmetro e BNDES também é um passo importante como indutor. Mas o nosso grande desafio é fazer uma revolução na forma de produzir e consumir. A pergunta que fica é: qual será o resultado em termos concretos para o consumidor?

 

Especialista em desenvolvimento sustentável, Cláudio Boechat, professor da Fundação Dom Cabral, diz que no Brasil ainda estamos na fase de entender a associação entre os negócios e seus impactos socioambientais:

— Estamos começando a sair do greenwashing (termo que designa a sustentabilidade de fachada) fácil e irresponsável. No entanto, pesquisas mostram que ainda é muito incipiente, no Brasil, empresas mexerem de fato em seus negócios para enfrentar o desafio da sustentabilidade. E para ser sustentável é preciso mudar a forma do fazer, ter uma visão mais estadista de futuro.

 

Completando cinco anos em 2010, o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da BM&FBovespa — uma carteira de investimento com empresas avaliadas como, além de rentáveis, sustentáveis — também está sendo revisado. Foi ampliado o número de empresas elegíveis a participar da carteira, que subiu de 150 para 200 ações mais negociadas da Bolsa. Foi criada ainda uma correlação entre o ISE e o Global Reporting Initiative (GRI), metodologia internacional para relatórios de responsabilidade social.

 

— Estamos sempre aperfeiçoando o índice. Este ano, incluímos às seis dimensões avaliadas no questionário (geral, natureza do produto, econômico-financeira, social, ambiental e governança corporativa) mudanças climáticas — conta Sônia Savaretto, diretora de Sustentabilidade da Bolsa, lembrando que o Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas é responsável pela metodologia de avaliação.

 

— A longo prazo, empresas sustentáveis têm chance de ser mais rentáveis — destaca Rogério Marques, coordenador de preços da Bolsa, ressaltando que ainda estamos no início da série.

A própria Bolsa está respondendo este ano ao questionário, informa Sônia. Ela chama atenção para o fato de que a representação setorial na carteira sinaliza uma movimentação do mercado rumo a sustentabilidade:

— Na última composição, houve um crescimento da participação de seguradoras e construtoras. Isso reflete, por exemplo, como catástrofes como o Katrina fizeram as seguradoras repensar seus processos, e o crescimento da tendência dos green buildings (prédios verdes) na construção civil.

 

Ibase acaba com selo e repensa modelo de controle social

 

Precursor na discussão sobre a declaração da responsabilidade social das empresas, há mais de uma década, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) acabou com o selo Balanço Social. É que verificou uso indevido por empresas, por exemplo, que adotavam o trabalho escravo. Agora, conta Cândido Grzybowski, diretor-geral do Ibase, a ONG estuda novas formas de controle social:

— Chegou um tempo em que era mais marketing do que exercício de responsabilidade social. Avançamos no diálogo, o Balanço Social teve papel importante. Agora precisamos trabalhar em formas de controle preventivo das atividades e seus impactos.

 

A crítica do cientista político e professor da PUC-Rio Ciro Torres é que as normas são feitas para abarcar de empresas petrolífera a pequenas indústrias e, por isso, não teriam o escopo necessário para promover a transformação dos negócios:

— A responsabilidade socioambiental tem que estar no core business (centro dos negócios). É claro a NBR é um avanço, mas precisamos de ferramentas que possam medir o ímpeto de transformação da empresa interna e externamente.

 

Para Marina Grossi, presidente-executiva do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), que há dez anos trabalha com o tema, houve uma melhora significativa nesta última década:

— No início era mais propaganda. Mas hoje os relatórios precisam ter credibilidade para os tomadores de decisão, quem investe e consome. É preciso que falhas da empresa e propostas para corrigi-las estejam no documento, para que seja crível.

Para Tomás Carmona, gerente de Desenvolvimento Sustentável da Serasa Experian, primeira empresa certificada em gestão de responsabilidade social pelo Inmetro, a certificação ajudou a solidificar conceitos:

— Hoje fazemos parte de um grupo multinacional e já servimos de referência para outras empresas.

Luciana Casemiro jornal: O GLOBO Editoria: Economia

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Site publicado em 04/05/2009
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