Flávio Citro - Direito Eletrônico

Itaú é condenado a pagar R$ 5 mil a deficiente visual por falha na prestação do serviço

O juiz Flavio Citro, do 23º Juizado Especial Cível da Capital, condenou o Banco Itaú a pagar R$ 5 mil de indenização, a título de dano moral, a uma deficiente visual por não prestar serviços adequados que possibilitem sua autonomia, conforme determinação legal.

A instituição financeira também terá que emitir para Kátia de Sousa Lima cartão bancário, extratos, faturas e comprovantes de transações, entre outros documentos, em linguagem em braile. Além disso, o banco terá que efetuar as adaptações necessárias nos caixas eletrônicos, ao menos na agência da autora, e disponibilizar fones de ouvido para fornecimento de informações necessárias à prestação dos serviços.

De acordo com o magistrado, de nada adianta o acesso físico ao serviço se não é dada autonomia e segurança ao portador de necessidades especiais para que possa utilizá-lo. “É notória a grandiosidade empresarial da parte ré no mercado financeiro, não sendo admissível que ainda não tenha disposto os meios corretos e necessários para atender aos portadores de necessidades especiais”, destacou.

Nº do processo: 0336497-83.2010.8.19.0001

Notícia publicada em 10/02/2011 13:48

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acompanhe o processo:

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leia a sentença na íntegra:

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
XXIII JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA CAPITAL

Processo nº. 0336497-83.2010.8.19.0001

Parte autora: KATIA DOS REIS DE SOUZA LIMA
Parte ré: BANCO ITAÚ S.A.

SENTENÇA

“As pessoas deficientes têm o direito inerente de respeito por sua dignidade humana. As pessoas deficientes, qualquer que seja a origem, natureza e gravidade de suas deficiências, têm os mesmos direitos fundamentais que seus concidadãos da mesma idade, o que implica, antes de tudo, o direito de desfrutar de uma vida decente, tão normal e plena quanto possível. (Resolução ONU N° 2.542/1975, item 3)”.

Trata-se de ação pelo rito sumaríssimo em que a parte autora, deficiente visual, requer que o banco réu emita o cartão nº 4341.5577.85743-01, para pagamento eletrônico de benefícios previdenciários, em linguagem em Braile; efetue as adaptações necessárias nos caixas eletrônicos, possibilitando a sua utilização, independentemente da ajuda de terceiros, ao menos na agência onde a autora efetua o saque do benefício a que sua irmã faz jus, e por fim, que a parte ré emita os extratos bancários, faturas, comprovantes de transações realizadas nos caixas eletrônicos ou quaisquer outros documentos impressos em Braile, assim como disponibilize a utilização de fones de ouvido para fornecimento de informações necessárias à prestação dos serviços, de acordo com a Lei nº 10.098/2000, o Dec. nº 5.296/2004 e a Lei Estadual nº 4.265/2004.

Requer ainda indenização a título de danos morais, ao argumento de que não recebe serviços adequados que possibilitem sua autonomia, conforme determinação legal. Em contestação, a parte ré alega, preliminarmente, a incompetência do Juizado Especial Cível, tendo em vista que a obrigação de fazer deve ser realizada no município de São João de Meriti, bem como se faz necessária a perícia na referida agência, a fim de comprovar se os serviços já estão à disposição do cliente. No mérito, impugna integralmente o pedido autoral. É o breve relatório. Decido.

DA ALEGADA INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL

Rejeito a preliminar de incompetência territorial do juízo, vez que o art. 4°, I, c/c parágrafo único da Lei 9.099/95 ditam que é competente o Juízo do foro do domicílio do réu, ou, a critério do autor, do local onde aquele exerça atividades profissionais ou econômicas ou mantenha estabelecimento, filial, agência, sucursal ou escritório, podendo o demandante postular, em qualquer hipótese, no foro previsto no inciso I.

Joel Dias Figueira Junior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes, lecionando sobre as regras de competência explanam que:

“tratando-se de ações destinadas à obtenção de reparação de danos oriundos de qualquer ato, fato ou natureza (note-se que o leque aberto pelo legislador é bastante significativo), a competência pode ser estabelecida tanto pelo domicílio do réu, quanto pelo do autor, ou, ainda, pelo local do ato ou fato.” (in Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Ed. Revista dos Tribunais, 2° edição, pg. 139).

No mesmo sentido, farta e uníssona jurisprudência:

2004.700.004075-8 – Juiz(a) CRISTINA TEREZA GAULIA – Sentença que extingue o processo sem apreciação do mérito por entender o Juízo haver incompetência territorial – Questionamento pelo autor de cobranças pela ré a título de taxa de iluminação pública – Competência do Juizado Especial Cível de origem – Lei nº 9099/95 que permite ao autor propor ação no domicílio do réu sem qualquer excepcionalidade – Sentença que se anula para que o Juízo a quo aprecie a causa e profira sentença de mérito.
2003.700.010106-0 – Juiz(a) GILDA MARIA CARRAPATOSO CARVALHO DE OLIVEIRA – Afirma a autora que, trabalhando como auxiliar de serviços gerais na Secretaria Municipal de Saúde, foi instada a abrir conta-corrente junto ao banco-réu, sendo exigido o pagamento de tarifas por diversos serviços prestados. Postula restituição, em dobro, dos valores cobrados a maior, no montante de R$ 290,00 e indenização por danos morais, a ser arbitrado pelo Juízo. As fIs. 09/10, o réu suscita a incompetência territorial do Juízo, uma vez que a autora é domiciliada no Município de Pinheral, onde também está localizada a agência do Banco na qual a demandante é correntista. A r. sentença de fls. 89 julga extinto o processo, sem exame de mérito, face à incompetência territorial, considerando o domicílio das partes na Comarca de Pinheral. Recorre a autora, surtentando que é faculdade do autor propor ação no local onde o réu mantenha sua sede ou filial, nos termos do art. 4º, I. da Lei 9.099/95. Requer a anulação da r. sentença, com o prosseguimento do feito. Contra-razões em prestígio do julgado. o relatório. Recurso regular, devendo ser conhecido. Pleiteia a demandante indenização por danos material e extrapatrimonial, em razão de cobranças de tarifas não previstas em conta-salário. Primeiramente, dertaque-se que o inciso I, do art. 4º. da Lei 9.099/95, disciplina a competência do Juizado para a apreciação das causas dispondo que a ação pode ser proposta no foro: “do domicilio do réu ou, a critério do autor, do local onde aquele exerça atividades profissionais ou econômicas ou mantenha estabelecimento, filial, agência, sucursal ou escritório”. Sobre a matéria leciona o eminente Ministro Luiz Fux” A Lei considera como domicílio passível de viabilizar a propositura das ações pelo autor, atalhando-lhe eventuais dificuldades na caracterização daquele, o local onde o réu exerça suas atividades profissionais ou econômicas ou mantenha estabelecimento, filial, agência, sucursal ou escritório (art. 4º, I). Observe-se que esse foro prevalece a escolha do autor sobre qualquer outro,como se colhe da dicção do parágrafo único do art. 4º, ao referir-se a “qualquer hipótese” prevista anteriormente. A criação do Juizado atende a um interesse tão maior de pacificação através do procedimento informal e prioritariamente conciliatório, que a lei superou a cláusula de foro para permitir o ajuizamento em qualquer dos foros do inciso I, o que se justifica à luz dos interesses em jogo” (in “Juizados Especiais Cíveis e Criminais e Suspensão Condicional do Processo Penal “; ed. Forense RJ, 1997; Weber Martins Batista e Luiz Fux, pgs. 106/08) Extrai-se, portanto, que pode a demandante propor ação nos localidades em que o Banco-réu desenvolva sua atividade. Assim, é competente o d. Juízo a quo para a apreciação e julgamento da presente causa. Nesse sentido, DOU PROVIMENTO ao recurso, para ANULAR a r. decisão monocrática, determinando o prosseguimento regular do feito. Sem custas, nos termos do art.55, da Lei 9099/95.

Rejeito a preliminar.

DA INCOMPETÊNCIA E DA ALEGADA NECESSIDADE DE PERÍCIA

Quanto à preliminar de incompetência do juízo em razão da necessidade de perícia técnica, esta também deve ser afastada porque os documentos trazidos aos autos são suficientes para o deslinde da questão, não tendo o réu se interessado em produção de laudo técnico autorizado pelo art. 35 da Lei 9099/95. REJEITO.

DO MÉRITO

No mérito, ressalto que a relação jurídica objeto da presente demanda é de consumo, uma vez que a parte autora encontra-se abarcada pelo conceito normativo positivado nos arts. 2º c/c 17 c/c 29 da Lei nº. 8.078/90 e, igualmente, a parte ré subsume-se ao conceito do art. 3º do referido diploma legal. Por essa razão, impõe-se a inteira aplicação das normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, inclusive no que se refere à possibilidade de inversão do ônus da prova em favor da parte autora e à natureza da responsabilidade civil da parte ré.

Assim, considerando as alegações veiculadas pela parte autora, tanto em seu pedido, quanto em AIJ, tenho como parcialmente procedentes as razões invocadas ao embasamento de sua pretensão. A contestação da parte ré reconhece a existência das disposições legais que determinam a acessibilidade dos deficientes visuais aos terminais de auto-atendimento bancários, pois sustenta que os serviços determinados em lei e que são tecnologicamente possíveis de serem disponibilizados já se encontram na agência em que a autora tem conta, quais sejam: 1) piso podotátil; 2) caixa eletrônico universal; 3) atendimento dos clientes através do Bankfone; 4) adaptação do site Itaú Bankline para acesso através de sintetizador de voz; 5) atendimento diferenciado e prioritário pelo gerente da conta.

No entanto, de nada adianta o acesso físico ao serviço se, ao portador de necessidades especiais, não lhe é dada autonomia e segurança para que possa utilizá-lo. Alega ainda, a parte ré, em contestação, que não existe nenhuma norma em vigor que obrigue a confecção de cartões, extratos, saldos, faturas e demais documentos em linguagem Braile, estabelecendo apenas, a Resolução nº 2.878 do BACEN, que “os dados constantes dos cartões magnéticos emitidos pelas instituições referidas no art. 1 devem ser obrigatoriamente impressos em alto relevo, para portadores de deficiências visuais”.

Alega ainda a parte ré que o pedido da instalação de fones de ouvido nos caixas eletrônicos já foi cumprido.

Sustenta a parte ré a inexistência da obrigatoriedade dos serviços requeridos pela parte autora, sem, no entanto, trazer aos autos, qualquer prova de fato impeditivo quanto à implementação tecnológica do que consta na previsão legal, contida nos artigos 1º e 2º da Lei Estadual nº 4.265/2004. Ainda que a atividade do banco seja estritamente financeira e comercial, esta não pode ser encarada como um fim em si mesmo, devendo levar em consideração, acima de qualquer coisa, o princípio da dignidade da pessoa humana, não sendo crível que todas as pessoas portadoras de necessidades especiais precisem demandar judicialmente para ver seus direitos garantidos.

É notória a grandiosidade empresarial da parte ré no mercado financeiro, não sendo admissível que ainda não tenha disposto os meios corretos e necessários para atender aos portadores de necessidades especiais. Ademais, se aderiu a um Termo de Conduta previamente, há presunção de que o cumprimento de tais normatizações está sendo executado ou em vias de sê-lo, sendo exigível que tenha meios para a disponibilização desses serviços especiais, quando necessário. Neste sentido, a Teoria Institucional da Empresa:

“pela qual o referido ente não é algo que se possa ter a propriedade declarada exclusivamente pelos sócios que a constituíram. A empresa seria, por assim dizer, de todos os entes com os quais se relaciona, pois os interesses de todos aqueles estão, direta ou indiretamente toldados na existência da empresa e desta dependem para os seus próprios desenvolvimentos.
Pela Teoria Institucional, o comprometimento, a interação e a parceria que se forma em torno de interesses dos diversos agentes ligados à empresa, sejam seus sócios, seus fornecedores, clientes, o Estado, a coletividade, é que vão determinar a razão do crescimento do negócio em virtude da utilidade para o grupo, numa concepção justo-social, em benefício de todos. É o que os americanos intitularam Agency, ou seja, “feixe de contratos”.
Por pura pertinência, … uma frase de Condillac (1):
“(…) o homem, ao invés de atentar para as coisas que pretende conhecer, as imagina e, de suposição falsa em suposição falsa, extravia-se do caminho certo, entre uma infinidade de erros, os quais, com o tempo, se transformam em preconceitos. Aliada ao preconceito, a paixão faz respeitar mais o erro do que a verdade.”
A ponderação de Condillac acerca da forma passional de pensar e entender as coisas reflete bem o que ocorre com as paixões que cercam esta jóia útil que é a empresa e as diversificadas óticas pelas quais seus conceitos se constroem cada qual “puxando a sardinha para o seu prato” (CONDILLAC, Étienne Bonnot de. Lógica ou Primeiros Desenvolvimentos da Arte de Pensar, in Os Pensadores. São Paulo: Ed. Vitor Civita, 1984. p. 101).

A parte ré deixou de fazer prova técnica a seu favor e, no entanto, juntou aos autos cópia do Termo de Ajustamento de Conduta – TAC – ACESSIBILIDADE, no item 3, Sanções em casos de descumprimento do TAC, em que é clara a previsão de multa nos casos de ausência de entrega de folheto de boas vindas em Braile e porta-cartão em Braile e alto-relevo.

Ora, se, algumas informações são devidas em braile, assim como o folheto e o porta-cartão, porque não seria obrigatório que o cartão, os extratos das transações, extratos mensais e quaisquer outros documentos relativos à movimentação da conta também fossem emitidos em Braile, se esse é o SISTEMA DE LEITURA para deficientes visuais?

Há computadores que já conseguem traduzir do braile e para o braile. Atualmente há os que conseguem imprimir páginas em frente e verso, reconhecer voz e transformá-la em braile, entre outros recursos que facilitam o acesso de deficientes visuais à informática. Há também capas para teclado com as teclas em braile. Estas se encaixam no teclado de modo que o deficiente visual pode digitar normalmente. Na prática, o comportamento dos bancos deixa a impressão de que é melhor indenizar o cliente insatisfeito do que investir em tecnologia. Existem outros projetos de lei que prevêem ainda a disponibilidade apenas de notas de 10 reais nos caixas destinados aos deficientes visuais, para que as notas possam ser contadas sem que haja a necessidade de colaboração de terceiros na conferência do valor sacado nos caixas eletrônicos.

Ou seja, a autora demanda acessibilidade com o escopo de ver garantida sua efetiva inserção social como portadora de necessidade especial, mas principalmente, valorizando a sua autonomia e seu exercício de cidadania.

Paradoxalmente, vemos que as instituições financeiras são as maiores patrocinadoras dos atletas paraolímpicos, e, no entanto, não primam por garantir direito básicos aos portadores de deficiências físicas dentro de suas próprias agências. Certamente essa política não se reverte em marketing ou em isenção de tributos.

Segundo o dicionário Aurélio, o conceito mais amplo de acessibilidade para a educação especial significa: “Condição de acesso aos serviços de informação, documentação e comunicação, por parte de portador de necessidades especiais”.

Pacífica e uníssona a jurisprudência doméstica:

2008.700.040201-0 – Juiz(a) BRENNO CRUZ MASCARENHAS FILHO – Julgamento: 15/09/2008 – Proc. 40.201-0/08 Recorrente: BANCO DO BRASIL (réu) Recorrido: João Paulo da Silva Xavier (autor) VOTO O réu foi condenado a instalar “caixa de atendimento a deficientes na agência Praça Seca”, a fornecer ao autor cartão magnético em Braille e a lhe pagar R$5.000,00 de indenização por danos morais (fls. 69). Recorreu o réu (fls. 70/73). * O autor é cego e correntista do réu. Dada a sua deficiência visual, o autor não tem condições de utilizar o seu cartão magnético e os terminais de auto-atendimento do réu. O autor já reclamou uma solução do réu, mas nenhuma providência foi tomada. Para utilizar os terminais de auto-atendimento do réu, o autor tem que contar com a ajuda a terceiros e lhes fornecer sua senha. Tais fatos são incontroversos. O réu, como instituição financeira, têm o dever de dispensar atendimento prioritário e “acesso prioritário” às “pessoas portadoras de deficiência física”, o que compreende “atendimento imediato”. É o que estabelecem os arts. 1º e 2º, da Lei 10.048/00, e o art. 5º, caput e §3º, do Decreto 5.296/04. Por outro lado, na forma dos arts. 1º e 2º, I, da Lei 10.098/00, e do art. 8º, I, do Decreto 5.296/04, a noção de “acessibilidade” envolve a possibilidade de utilização dos serviços do réu com “autonomia” “total”, a menos que o deficiente físico necessite de “assistência”. Dessa forma, o réu se obriga a instalar na sua agência caixa eletrônico que lhe seja acessível e a fornecer ao autor cartão magnético que lhe permita operar o equipamento sem a ajuda de terceiro. Merece destaque a circunstância de que o réu admite a viabilidade material do fornecimento dos dispositivos em pauta ao autor (razoes de recurso, fls. 71 e 72). Outrossim, deixando de adaptar suas agências às imposições dos dispositivos legais aludidos, o réu causou ao autor insegurança, perplexidade, constrangimento, abalo psicológico e, conseqüentemente, dano moral, que deve ser indenizado. Quanto à verba indenizatória, sou de alvitre que R$5.000,00 constituem compensação adequada para o autor, tendo em vista o princípio da proporcionalidade. ANTE O EXPOSTO, voto no sentido de se negar provimento ao recurso e de se condenar o réu a pagar honorários advocatícios de 20% do valor da condenação. Rio de Janeiro, 15 de setembro de 2008 BRENNO MASCARENHAS Juiz Relator

2010.700.027927-0 – Juiz(a) MARCELLO DE SA BAPTISTA – Julgamento: 26/05/2010 – Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro Quarta Turma Recursal RECURSO nº 0140172-09.2008.8.19.0001 RECORRENTE: BANCO IBI S/A RECORRIDO: SEGIO DE LIMA FIGUEIRA Relatório. Trata-se de execução de sentença que julgou procedente em parte os pedidos, para que a reclamada fornecesse cartão com informações em Braile, sob pena de multa diária no valor de R4 30,00 e condenado a reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (fls. 56/58). Não houve recurso da sentença proferida. Efetuado depósito dos valores referentes condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Às fls. 71/72, manifestou-se o reclamante requerendo a execução da obrigação de fazer. Apresentou planilha com multa no valor de R$ 1.260,00. Auto de penhora e depósito (fls. 79). Exceção de pré-executivo apresentada, sendo rejeitada, não havendo impugnação da decisão (fls. 111). Às fls. 1218/120, manifestou-se a reclamante requerendo a execução da multa em face ao descumprimento da obrigação, no valor de R$ 5.260,00, alem dos valores referentes indenização por danos morais, totalizando R$ 8.877,90. Decisão de fl. 132 não convertendo obrigação de fazer em perdas e danos. Auto de penhora e depósito, no valor de R$ 5.260,00 (fls. 135). Embargos do devedor, alegando em síntese, impossibilidade do cumprimento da obrigação de fazer, pois não possui de meios tecnológicos suficientes para que o cartão seja emitido com as informações em Braile. Requer seja a obrigação de fazer convertida em perdas e danos (fls.136/143) Impugnação aos embargos do devedor, alegando não haver qualquer impossibilidade no cumprimento do julgado, pois várias empresas já estão adaptando seus produtos e serviços de forma atender as necessidades dos deficientes visuais, requerendo ainda a improcedência dos embargos. (fls. 152/153) Sentença julgando improcedentes os embargos, para declarar a não conversão da obrigação em perdas e danos e incidência da multa diária até a presente data (fls. 155). Recurso inominado da parte embargante, ratificando teses dos embargos. Requer seja dado provimento ao recurso para reformar a sentença a fim de ser a obrigação de fazer em perdas e danos, no valor de R$ 5.260,00 (fls. 156/163). Contrarrazões de recurso. Requer seja negado provimento ao recurso e mantida a sentença (fls. 172/175). VOTO. Há coisa julgada em relação obrigação de fazer imposta na sentença. Parte reclamada que não recorreu da sentença proferida na ação de conhecimento. Simples alegação de impossibilidade técnica de cumprir obrigação, que não pode amparar pedido formulado. Ausência de qualquer laudo técnico apresentado, por profissionais habilitados, demonstrando a impossibilidade de ser emitido cartão magnético de crédito, com informação em Braile. Não há que se falar de produção de prova negativa. Meios de prova da suposta impossibilidade técnica ao alcance da parte embargante. Impossibilidade para cumprimento da obrigação, para efeitos de conversão em perdas e danos que deve ser absoluta. A onerosidade no cumprimento da obrigação e/ou dificuldade, não são passíveis de ampararem conversão em perdas e danos. Cartão de crédito que deverá ser dotado de informações em Braile, possibilitando acesso as informações contidas no mesmo, pelo reclamante e informações regulares, no vernáculo adotado no país, permitindo serem lidas pelas demais pessoas, que não saibam ler em Braile. Necessidade de integração do portador de necessidades especiais a sociedade, que deve ser garantida pelo Poder Judiciário. Consumidor que tem direito de identificar seu cartão magnético, no momento em que realiza operações e quando o cartão lhe é devolvido, afastando inclusive, possibilidade de trocas e fraudes, que inclusive, podem gerar prejuízos ao fornecedor. Reclamante não deseja alteração do sistema de outorga de crédito da reclamada, apenas, que seu cartão, possua informações em Braile, possibilitando seu manuseio de forma regular, fato que já deveria ter sido disponibilizado, inclusive de forma administrativa. Fato não constituir favor ao reclamante, mas sim, direito que lhe é garantido constitucionalmente e na forma do título executivo. Valor da mulata que não é excessivo e não foi ainda capaz de compelir a executada, cumprir obrigação. Embargos do devedor em que é apenas impugnado valor da multa pelo descumprimento da obrigação de fazer. Pedido de conversão em perdas e danos que não procede. Voto para que o recurso seja conhecido e desprovido, coma condenação da parte recorrente ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que arbitro em 20% sobre o valor da execução da multo pela obrigação de fazer. Rio de Janeiro, 23 de maio de 2010. MARCELLO DE SÁ BAPTISTA – Juiz Relator

No mesmo sentido, o brilhante voto do Exmo. Ministro Luis Felipe Salomão, que não poderia deixar de consignar:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.107.981 – MG (2008/0272300-6)
RECORRENTE: BANCO BRADESCO S/A
ADVOGADOS: LINO ALBERTO DE CASTRO E OUTRO(S)
ANA VITÓRIA MANDIM THEODORO E OUTRO(S)
OSMAR MENDES PAIXÃO CÔRTES E OUTRO(S)
RECORRIDO: FRANCO DE REZENDE MENDES GROIA
ADVOGADO: ROBERTO MENDES GROIA
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO:
1. Cuidam os autos de ação de indenização por danos morais movida por Franco de Rezende Mendes Groia contra Banco Bradesco S.A., assim relatada em grau de apelação:
Cuida-se de ação de indenização por danos morais c/c obrigação de fazer, proposta por Franco de Rezende Mendes Groia contra Banco Bradesco S.A., tendo em vista o fato de que o autor, sendo portador de deficiência física, não se sente bem atendido pelo banco réu, o qual, segundo o primeiro, jamais foi capaz de atender os deficientes com caixas eletrônicos de acesso facilitado ou com funcionários nos pontos de auto atendimento.
Alega o autor estar ele excluído pelo serviço bancário, não se encaixando nos padrões em que estes serviços são oferecidos aos consumidores e pugna, além da indenização, pela obrigação de fazer, por parte do réu, de melhorias dos serviços prestados ao autor, extensivamente aos demais portadores de deficiência física.
O M.M. Juiz a quo, em audiência, após oitiva de depoimentos pessoais das partes, prolatou sentença (f. 133/139), julgando procedente, em parte, os pedidos iniciais, para condenar o banco réu a reparar ao autor os danos morais a ele causados, na quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), e para condená-lo, ainda, à obrigação de fazer, consistente na viabilização da utilização dos caixas de auto-atendimento ou pelo menos um deles, aos portadores de deficiência locomotiva, na agência 0080-9, em 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária.
O banco réu apelou (f. 153/166), alegando, inicialmente, inexistir previsão legal da obrigação a que foi condenado, não sendo ninguém obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei.
Aduz que têm as instituições financeiras obrigação de estabelecer em suas dependências, alternativas técnicas, físicas e especiais que garantam o atendimento prioritário aos deficientes, tal como dispõe a Resolução n.º 2878 do BACEN, não havendo obrigação, contudo, de possuir um caixa de auto-atendimento, nunca tendo deixado de atender às exigências legais de viabilização do acesso do autor aos serviços necessários e inerentes à movimentação de sua conta bancária.
Argumenta, ainda, o banco apelante serem razoáveis as medidas por ele adotadas para atender os portadores de deficiência, segundo o que há disponível no mercado, havendo caixa especial dentro das agências e funcionários para auxiliá-los dentro e fora das agências, inclusive para acompanhá-los nos caixas de auto-atendimento.
Quanto à obrigação de indenizar, aduz ser ela inexistente, uma vez que não houve ato ilícito por ele cometido, exatamente por não haver lei obrigando o banco a disponibilizar caixa de auto-atendimento aos portadores de deficiência. Além disso, alega não ter havido dano, não tendo o autor-apelado comprovado nos autos ter sido submetido a constrangimentos psíquicos quando precisou usar o caixa automático. E continua, afirmando não ter havido agressão ao apelado ou falta de respeito para com o mesmo.
O autor apresentou recurso adesivo (f. 181/183), pedindo a majoração do quantum indenizatório para o valor requerido na exordial, qual seja, 100 (cem ) salários mínimos. O autor, em seguida, apresentou contra-razões à apelação principal (f. 184/189) e o réu também apresentou suas contra-razões ao apelo adesivo às f. 201/207.
Recursos regularmente processados e devidamente preparado o principal (f. 174), estando o autor apelante adesivo sob o pálio da justiça gratuita.
É o Relatório.(fls. 221/223).

Às apelações foi conferido o seguinte julgamento pelo Tribunal de origem:
AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO MORAL C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. ACESSO DE PORTADOR DE DEFICIÊNCIA FÍSICA A CAIXAS DE AUTO-ATENDIMENTO. AUSÊNCIA. ADAPTAÇÃO DOS CAIXAS DE AUTO-ATENDIMENTO AOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA FÍSICA. AUSÊNCIA DE DISPOSIÇÃO LEGAL. DEVER CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIOS. FIXAÇÃO DOS DANOS MORAIS.
Em que pese ausência de disposição legal no sentido de que os bancos devem adaptar seus caixas de auto-atendimento às necessidades dos portadores de deficiência física, fato é que, dos princípios constitucionais expressos nos arts. 227 e 244 da CR/88, extrai-se que se deve permitir acesso de deficientes físicos a todos os serviços mormente ao serviço público por excelência que é o bancário, embora relegado para iniciativa privada. Inexistido em nosso ordenamento jurídico regras precisas para a fixação da indenização a título de danos morais, deve tal fixação ocorrer ao prudente arbítrio do juiz, que, da análise das circunstâncias do caso concreto, e informado pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, determinará o valor mais condizente com o grau da culpa do agente e a extensão do prejuízo sofrido.
V.V.
AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO MORAL C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. ALEGAÇÃO POR PORTADOR DE DEFICIÊNCIA FÍSICA DE FALTA DE ACESSO AOS CAIXAS DE AUTO-ATENDIMENTO FORA DO HORÁRIO DE EXPEDIENTE BANCÁRIO. ALEGADO, TAMBÉM, MAU ATENDIMENTO NO HORÁRIO DE EXPEDIENTE BANCÁRIO APELAÇÃO PRINCIPAL. INEXISTÊNCIA DE LEI IMPONDO A ADEQUAÇÃO DOS CAIXAS DE AUTO-ATENDIMENTO AOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA. LEI QUE IMPÕE A ACESSIBILIDADE AOS CAIXAS DE AUTO-ATENDIMENTO. EXISTÊNCIA DE UM CAIXA EXCLUSIVO PARA ATENDIMENTO NO HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO DO BANCO E DE FUNCIONÁRIOS PARA AUXILIAR OS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. NEGADO O PLEITO INDENIZATÓRIO. INOCORRÊNCIA DE ATO ILÍCITO POR PARTE DO BANCO. NÃO COM PROVAÇÃO DE DANO SOFRIDO PELO AUTOR NO BANCO APELANTE. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DA EXORDIAL. PROVIMENTO. APELAÇÃO ADESIVA PREJUDICADA.
Inexistindo lei obrigando o banco apelante principal a possuir caixas de auto-atendimento adaptados para os portadores de deficiência física, não há como obrigá-lo a adequar referidos caixas, mas garantir que os portadores de deficiência tenham acessibilidade aos mesmos no horário de expediente bancário, aplicando-se o princípio da razoabilidade; Não havendo imposição legal ou obrigação de fazer, inexiste ato ilícito por parte do banco apelante principal, além de não ter restado demonstrado nos autos qualquer dano sofrido pelo autor-apelado principal dentro do banco apelante. (fl. 229). Opostos embargos de declaração, estes receberam julgamento assim sumariado:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NA DECISÃO EMBARGADA. REDISCUSSÃO DE MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO OU OMISSÃO INEXISTENTES. DESNECESSIDADE DE MENÇÃO A TODOS OS DISPOSITIVOS LEGAIS SOLICITADOS PELA PARTE. PROTELAÇÃO. APLICAÇÃO DE MULTA.
Não se devem acolher embargos de declaração com efeitos infringentes quando, a pretexto de integrar ou esclarecer o julgado anterior, buscam, na verdade, reformá-lo. Não está o julgador obrigado a mencionar expressamente todos os dispositivos legais suscitados pelas artes, mas sim decidir fundamentadamente as matérias para as quais foi o Judiciário efetivamente provocado. Em razão de os embargos de declaração não constituírem meio idôneo para corrigir os fundamentos da decisão recorrida, forçoso é concluir que o recurso é manifestamente protelatório, o que, a teor do disposto n o art. 538, parágrafo único do CPC, enseja condenação em multa. (fl. 256).Irresignado, Banco Bradesco S.A. interpõe recurso especial pela alínea “a” da permissão constitucional, por violação aos artigos 2º, caput, I e VI da Lei 10.098/2000; 5º, caput, § 3º, 8º, caput, I do Decreto 5.296/2004, sustentando a seguinte fundamentação:

a) a Lei 10.098/2000 e o seu Decreto regulamentador conferiram eficácia aartigo 227, § 2º e 244 da Constituição Federal, sendo destarte a norma infraconstitucional que regulamenta as normas e obrigações impostas aobancos sobre a adaptação de suas instalações e equipamento ao acesso dos portadores de deficiência;
b) a leitura dos preceitos normativos revela que as obrigações das instituições financeiras no campo da acessibilidade dizem respeito ao estabelecimento, em suas dependências de alternativas técnicas, físicas e especiais que garantam atendimento prioritário para as pessoas portadoras de deficiência física ou com mobilidade reduzida, por meio de garantia de lugar privilegiado em filas, atendimento preferencial, caixa para atendimento exclusivo e implantação de outro serviço de atendimento personalizado ao deficiente” (fl. 278);
c) no caso dos autos o recorrido correntista da agência desde 1993, sempre teve acesso aos serviços de movimentação de sua conta bancária, com caixa especial à disposição no interior da agência, assegurando ao correntista portador de necessidades especiais, segurança e autonomia nas suas movimentações financeiras;
d) é equivocada a fixação de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), o que caracteriza ofensa ao artigo 186 do Código Civil de 2002, pois a atitude do banco não pode ser considerada ilícita, na medida em que não está obrigado a manter caixa eletrônico especial para atendimento ao recorrido, após o horário de funcionamento bancário;
e) afigura-se indevida a rejeição de embargos de declaração e a aplicação da multa do artigo 538 do CPC, porque não se pode ter como protelatórios embargos declaratórios opostos com intuito de prequestionamento, eis ser essa a única forma de acesso às instâncias extraordinárias.
Às fls. 291/302 foi protocolada petição de recurso extraordinário pelo recorrente.
Contra-razões ofertadas às fls. 308/313, pugnando pela integridade do aresto reclamado.
Às fls. 322/324 foi prolatada decisão conferindo crivo positivo de admissibilidade ao recurso especial. Inadmitido o recurso extraordinário, fls. 326/328, foi interposto agravo de instrumento pelo recorrente, fl. 330.
É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.107.981 – MG (2008/0272300-6)
RELATOR: MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE: BANCO BRADESCO S/A
ADVOGADOS: LINO ALBERTO DE CASTRO E OUTRO(S)
ANA VITÓRIA MANDIM THEODORO E OUTRO(S)
OSMAR MENDES PAIXÃO CÔRTES E OUTRO(S)
RECORRIDO: FRANCO DE REZENDE MENDES GROIA
ADVOGADO: ROBERTO MENDES GROIA
EMENTA
VOTO O SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
2. A questão é complexa, reside em saber se há obrigação da instituição financeira em proporcionar ao autor, seu cliente há cerca de dezessete anos e portador de necessidades especiais, atendimento em caixa eletrônico de sua agência bancária, após o horário de expediente, ensejando obrigação de fazer e desafiando o dano moral, diante da omissão.
A matéria tratada nos preceitos ditos violados foi expressamente ventilada no voto condutor dos embargos de declaração (fls. 260), conforme se constata do excerto abaixo transcrito: Por fim, em relação ao prequestionamento pleiteado, referente ao art. 2º, caput, e incisos I e VI da Lei 10.098/2000, 5º, caput e § 3º e 8º, caput e inciso I do Decreto 5.296/2004 e 927 do Código Civil, deve-se observar que, embora não se tenha mencionado expressamente todos os dispositivos ora citados pelo embargante no acórdão recorrido, houve apreciação fundamentada quanto a todas as questões pertinentes à obrigação de fazer imposta ao embargante, conforme se destacou alhures, não constituindo obrigação do órgão julgador pronunciar-se sobre todos os dispositivos legais existentes a respeito de determinada matéria (fl. 260).
3. O recorrente apega-se ao argumento de que inexiste previsão legal a lhe impor a adaptação de caixas automáticos para atendimento após o horário de expediente bancário. A legislação invocada pelo recorrente como infringida possui a seguinte redação:
Lei 10.098/2000:
Art. 2º. Para os fins desta Lei são estabelecidas as seguintes definições:
I – acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida;
(…)
VI – ajuda técnica: qualquer elemento que facilite a autonomia pessoal ou possibilite o acesso e o uso de meio físico.
Decreto n. 5.296/2004.
Art. 5º Os órgãos da administração pública direta, indireta e fundacional, as empresas prestadoras de serviços públicos e as instituições financeiras deverão dispensar atendimento prioritário às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida. )
§ 3º O acesso prioritário às edificações e serviços das instituições financeiras deve seguir os preceitos estabelecidos neste Decreto e nas normas técnicas de acessibilidade da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT, no que não conflitarem com a Lei n. 7102, de 20 de junho de 1983, observando, ainda, a
Resolução do Conselho Monetário Nacional nº 2.878 de 26 de julho de 2001.
Art. 8º. Para os fins de acessibilidade, considera-se:
I. acessibilidade: condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou
assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida.
4. Na verdade, a interpretação sistemática e teleológica dos preceitos normativos acima relacionados, conduz a uma conclusão diferente daquela firmada pelo recorrente.
4.1 Com efeito, essa é a doutrina de José de Oliveira Ascensão em – “O Direito, Introdução e Teoria Geral”, 3ª edição, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, n. 194, p. 321: A interpretação deve ter em conta a “unidade do sistema jurídico”. Repetidamente acentuamos já que toda a fonte se integra numa ordem, que a regra é modo de expressão dessa ordem global. Por isso a interpretação duma fonte não se faz isoladamente, atendendo por exemplo a um texto como se fosse válido fora do tempo e do espaço. Resulta pelo contrário da inserção desse texto num conjunto jurídico dado.
O texto legal do artigo 2º da Lei 10.098/2000, define como acessibilidade, a possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos e, com ajuda técnica, qualquer elemento que facilite a autonomia pessoal ou possibilite o acesso e o uso de meio físico. Por sua vez, o Decreto n. 5.296/2004, regulamentador do
supracitado preceito legal, afirma que deverá ser dispensado atendimento prioritário às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e observa, em seu artigo 8º, que acessibilidade é a condição de utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços mobiliários.
4.2. Nos termos da legislação invocada e atento ao contexto fático dos autos, parece que a expressão “atender com prioridade, dando acesso com segurança e autonomia às pessoas com deficiência física”, na verdade deve representar a utilização de todos os meios necessários a que a finalidade colimada pelo legislador se cumpra. Certamente que se o deficiente encontra restrição ao exercício de seu direito de – como no caso concreto – movimentar sua conta corrente, em virtude das restrições impostas pelo horário de funcionamento bancário e falta de caixas de auto-atendimento fisicamente manejáveis, existe grave violação à legislação normativa da espécie, examinada sistematicamente e em conjunto, na medida em que não atendida a finalidade ali prevista.
4.3. Nessa linha, embora não haja previsão expressa para que “as instituições financeiras disponibilizem caixas de auto atendimento aos deficientes físicos”, a omissão é suprida pela interpretação conjunta dos referidos diplomas, em consonância com a Constituição Federal, e não alija o recorrente de atendê-lo, muito pelo contrário, ainda mais o obriga, pois como assinalado na doutrina de Oliveira Ascensão “a interpretação deve ter em conta a “unidade do sistema jurídico”. Acerca da necessidade de amparo aos portadores de deficiência, importante é a lição de José Afonso da Silva, ao comentar o artigo 227 da Constituição Federal, in Comentário Contextual à Constituição; 6ª edição atualizada; Malheiros Editores, ps. 862/863:Essa proteção entrou no direito constitucional por via da Emenda Constitucional 12/1978 à Constituição de 1969, por proposta do senador Tales Ramalho, que se tornara deficiente físico em conseqüência de acidente automobilístico – com o quê sentiu as dificuldades e discriminações por que passam os portadores de deficiência.
A Constituição vigente preocupou-se com a questão, tanto que em quatro oportunidades dispôs sobre ela: duas vezes no art. 203 (incisos IV e V); duas vezes, no artigo em comentário (art. 227, § 1º, II e § 2º). No art. 203 se estabelece que entre os objetivos da assistência social está o da habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária, assim como o de lhes garantir um salário mínimo de benefício mensal quando não disponham de meios a prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. O art. 227, § 1º, II prevê – como nele se lê – a criação pelo Estado de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos. As normas desse in ciso dirigem-se especificamente à criança e ao adolescente portadores de deficiência. O § 2º do mesmo artigo determina, por seu lado, que a lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo. a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência. Está é uma disposição de caráter geral, destinada a todos os portadores de deficiência. Por isso ela está deslocada como parágrafo de um artigo que estatui sobre os direitos da criança e do adolescente. Na verdade, todas essas disposições sobre os portadores de deficiência deveriam ter sido reunidas em um único artigo, que poderia estar inserido no capítulo da assistência social. Seja como for, elas prevêem ações afirmativas em favor dessas pessoas. Não são normas programáticas. São normas de eficácia plena e aplicabilidade imediata. Isso não significa que uma lei estatuindo sobre a concreção desses direitos na vida prática seja desnecessária. Não o é – e aí está a Lei 7.853/1989, que dispõe sobre o apoio a todas as pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, institui a Coordenadora Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – CORDE e a tutela jurisdicional de direitos coletivos e difusos dessas pessoas, assim como disciplina a atuação do Ministério Público e define crimes pertinentes ao tema. Estabelece a lei normas gerais que asseguram o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiência e sua efetiva integração social, assim como normas que visam a garantir as essas pessoas as ações governamentais necessárias ao cumprimento das disposições constitucionais e legais que lhes concernem, afastadas as discriminações e os preconceitos, entendida a matéria como obrigação nacional do Poder Público e da sociedade, a que cabe assegurar a plenitude dos direitos individuais, sociais e políticos das referidas pessoas. É importante observar que a própria lei estatui que na sua interpretação e aplicação serão considerados os valores básicos de igualdade de tratamento e oportunidade, da justiça social, do respeito à dignidade da pessoa humana, do bem estar, e outros, indicados na Constituição ou justificados pelos princípios gerais de Direito; e define os direitos concretamente reconhecidos nas áreas de educação, saúde, formação profissional, trabalho, recursos humanos e das edificações, incluindo nestas a adoção e a efetiva execução de normas que garantam a sua funcionalidade e das vias públicas, de modo a evitar ou remover os óbices àquelas pessoas no que tange ao acesso a edifícios , logradouros e meios de transportes. E, para conferir meios eficazes ao gozo desses direitos, as ações civis públicas destinadas à proteção de interesses coletivos ou difusos das pessoas portadoras de deficiência, que podem ser propostas pelo Ministério Público, pela União, Estados, Distrito Federal e Município, autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia ou associação constituída há mais de um ano que inclua entre suas finalidades institucionais, a proteção das pessoas portadoras de deficiência. É de lembrar também a Lei 10.098/2000 que justamente estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências (v. art. 244).
Enfim, as normas constitucionais e legais oferecem amparo suficiente às pessoas portadoras de deficiência, bastando que sejam efetivadas na prática.
Este STJ ao julgar o REsp 583464/DF, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, em que se examinou pedido da construção de uma rampa com corrimãos para deficientes e pessoas com dificuldade de locomoção, a fim de que tivessem acesso, ao menos a uma daspiscinas de clube social, assim consignou:
(…)
A Lei 7.853/89, de acordo com seu art. 1.º, visa assegurar o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiências, e a sua efetiva integração social.
De acordo com o § 1.º desse artigo, na aplicação e interpretação da Lei o juiz deve se pautar pelos valores básicos da igualdade de tratamento e oportunidade, da justiça social, do respeito à dignidade da pessoa humana, do bem estar, bem como de outros valores indicados na Constituição ou justificados pelos princípios gerais de direito. Consta também do § 2.º do art. 1.º que, na aplicação da Lei 7.853/89, devem ser “afastadas as discriminações e os preconceitos de qualquer espécie, e entendida a matéria como obrigação nacional a cargo do Poder Público e da sociedade”. Por fim, o art. 2.º dispõe que ao Poder Público e seus órgãos (entre esses o Ministério Público) “cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem estar pessoal, social e econômico”.
E, nos termos do art. 2.º, parágrafo único, V, “a”, da Lei 7.853/89, entre as medidas a serem implementadas por tais entes para viabilizar o exercícios dos direitos por ela assegurados, especificamente na área de edificação está “a adoção e a efetiva execução de normas que garantam a funcionalidade das edificações e vias públicas, que evitem ou removam os óbices às pessoas portadoras de deficiência, permitam o acesso destas a edifícios, a logradouros e a meios de transporte”.
(…)
Seguindo essa mesma orientação, os seguintes julgados:
OBRIGAÇÃO DE FAZER. METRO. CONSTRUÇÃO DE OBRAS DE ACESSO A
DEFICIENTES FÍSICOS. PRAZO PARA CUMPRIMENTO. INFRAÇÃO A NORMAS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. MATÉRIA FÁTICA. RECURSO ESPECIAL INADMISSÍVEL. MULTA COMINADA NO ART. 538, PARAGRAFO ÚNICO, DO CPC. – EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL NÃO SE EXAMINA ASSERTIVA DE CONTRARIEDADE A TEXTO CONSTITUCIONAL. – E IMPRÓPRIO O APELO ESPECIAL PARA DIRIMIR QUESTÃO CONCERNENTE A DIREITO LOCAL (SUMULA N. 280-STF). – FIXAÇÃO DE PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL QUE SE INSERE NO PLANO DOS FATOS. INCIDÊNCIA DA SUMULA N. 07-STJ. – A IMPOSIÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 538, PARAGRAFO ÚNICO, DO CPC, SUBORDINA-SE A QUE O TRIBUNAL DECLARE O INTUITO MANIFESTAMENTE PROCRASTINATÓRIO DOS EMBARGOS OPOSTOS, COM A DEVIDA JUSTIFICAÇÃO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO, EM PARTE, E PROVIDO, PARA EXCLUIR A MULTA. (REsp 37.162/SP, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 16/09/1997, DJ 17/11/1997 p. 59545).

CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. PARLAMENTAR. DEFICIENTE FÍSICO. UTILIZAÇÃO DA TRIBUNA DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. ACESSO NEGADO. ILEGALIDADE. IGUALDADE DE TRATAMENTO. VALORIZAÇÃO DE PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL.
1. Concessão de mandado de segurança em favor de Deputada Estadual portadora de deficiência física para que sejam criadas condições materiais, com a reforma da Tribuna para lhe permitir fácil acesso, de expor, em situação de igualdade com os seus pares, as idéias pretendidas defender, garantindo-lhe o livre exercício do mandato.
2. Odiosa omissão praticada pelo Presidente da Assembléia Legislativa por não tomar providências no sentido de adequar a Tribuna com acesso fácil para a introdução e a permanência da impetrante em seu âmbito, a fim de exercer as prerrogativas do mandato em posição equânime com os demais parlamentares.
3. Interpretação do art. 227, da CF/88, e da Lei nº 7.853, de 24/10/89.
4. Da Tribuna do Egrégio Plenário Legislativo é que, regimentalmente, servem-se, obrigatoriamente, os parlamentares para fazer uso da palavra e sustentar posicionamentos e condições das diversas proposições apresentadas naquela Casa.
5. É a Tribuna o coração do parlamento, a voz, o tratamento democrático e necessário a ser dado à palavra de seus membros, a própria prerrogativa máxima do Poder Legislativo: o exercício da palavra.
6. A Carta Magna de 1988, bem como toda a legislação regulamentadora da proteção ao deficiente físico, são claras e contundentes em fixar condições obrigatórias a serem desenvolvidas pelo Poder Público e pela sociedade para a integração dessas pessoas aos fenômenos vivenciados pela sociedade, pelo que há de se construírem espaços acessíveis a elas, eliminando barreiras físicas, naturais ou de comunicação, em qualquer ambiente, edifício ou mobiliário, especialmente nas Casas Legislativas.
7. A filosofia do desenho universal neste final do século inclina-se por projetar a defesa de que seja feita adaptação de todos os ambientes para que as pessoas com deficiência possam exercer, integralmente, suas atividades.
8. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança provido para reconhecer-se direito líquido e certo da impetrante de utilizar a Tribuna da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, nas mesmas condições dos demais Deputados, determinando-se, portanto, que o Presidente da Casa tome todas as providências necessárias para eliminar barreiras existentes e que impedem o livre exercício do mandato da impetrante.
9. Homenagem à Constituição Federal que deve ser prestada para o fortalecimento do regime democrático, com absoluto respeito aos princípios da igualdade e de guarda dos valores protetores da dignidade da pessoa humana e do exercício livre do mandato parlamentar. (RMS 9.613/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/05/1999, DJ 01/07/1999 p. 119).

5. A ampliação dos sistemas de auxílio às pessoas com deficiência física, visual, auditiva ou mental deve ser colocada em prática, inclusive fora do horário de funcionamento bancário. Merece menção, no particular, o seguinte trecho extraído da excelente Monografia apresentada ao Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Ciência da Informação e Documentação da UNB, assinada por Jonas Levy Pacheco Vieira, Sérgio Freitas Sena, Wagney Schunck de Godoy (disponível no site eletrônico http://www.jonas.com.br/MBA.pdf, visitado dia 22/08/2010):
(…)
Em 10 de dezembro de 1948, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou e proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em seus Artigos 1º e 2º afirmam: Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. Todo homem tem capacidade para gozar os direitos e liberdades estabelecidas nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo,língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. As tumultuosas relações humanas e políticas nas décadas sucessivas a esta declaração,entretanto, não pouparam conflitos de todas as espécies para, enfim, permitir reconhecer e integrar as diversas minorias ao redor do planeta, quer seja em virtude da raça, orientação sexual, religião ou cor. Nesta fase, coube exclusivamente ao Estado a responsabilidade de criar mecanismos que viabilizassem esta integração, normalmente baseados em leis, estabeleciam punições à discriminação e ao preconceito. Inseridos nestas legislações, os indivíduos portadores de deficiências foram amparados pelos direitos comuns de cidadão somente na igualdade de tratamentos e acessos a serviços especiais de saúde e educação a partir da Declaração Universal dos Direitos das Pessoas Deficientes (MERCADANTE, 2004).
Após décadas de desenvolvimento tecnológico e das forças de produção, a percepção de ameaça à própria continuidade da raça humana fez as estruturas capitalistas do mundo contemporâneo cederem aos princípios de responsabilidade sócio-ambiental, a partir do reconhecimento público destas práticas como diferencial competitivo das organizações, onde além do respeito ao meio-ambiente, deve-se privilegiar a comunidade em busca de melhoria do índice de desenvolvimento humano (IDH), como forma de garantir e desenvolver o ciclo produtivo (matérias-primas, fornecedores, colaboradores, clientes). O IDH leva em conta a renda (PIB – Produto Interno Bruto per capita), a longevidade e educação da população de cada país.
Neste cenário há a participação ativa do segundo setor (privado) como co-responsável às questões sociais, principalmente na geração de renda digna (não assistencialista) à eliminação da exclusão social. Simultaneamente, há maior inserção (a partir da política de cotas de portadores no quadro de empregados em empresas de médio e grande porte, prevista portadores no quadro de empregados em empresas de médio e grande porte, prevista na Lei 8.213/91, artigo 93º, posteriormente regulamentada no Decreto 3298/99) dos portadores de deficiência na atividade econômica nacional, e automaticamente sua atuação no mercado enquanto cidadão e consumidor. Este enquadramento social está diretamente ligado à necessidade de utilizar serviços bancários para receber salários, consumir, administrar seu patrimônio e planejar seu futuro. Assim como outros serviços disponíveis à comunidade, a disponibilidade, conveniência e portabilidade, típicas do ritmo de vida do cidadão contemporâneo, exigiram dos Bancos a oferta de seus serviços através de canais de auto-atendimento eletrônicos que, particularmente no Brasil, tem evoluído de forma a propiciar cada vez mais opções em diversos meios de acesso (Internet banking, mobile banking, terminais de auto-atendimento, etc).
A tecnologia, elemento chave para esta evolução, tem contribuído agregando cada vez mais potencial de interação aos recursos computacionais utilizados nestes meios, de forma a permitir explorá-los de forma combinada, facilitando a vida dos usuários por, não só adaptar-se às capacidades e limitações destes indivíduos como permitir que suas preferências sejam consideradas.
Desse modo, algumas facilidades físicas e tecnológicas, do nosso dia-a-dia, podem ser revistas independente de não estarem previstas em lei, visando permitir a perfeita utilização por esta comunidade. Este conceito denominado acessibilidade será explorado especificamente no uso dos canais de autoatendimento eletrônico bancário (banking), por serem consideradas interações mais comuns aos usuários de produtos financeiros no Brasil.
(…)
O reconhecimento público das limitações de capacidade das pessoas portadoras de deficiência e dos direitos destes indivíduos, enquanto cidadãos, aos recursos básicos e específicos de saúde e educação, assim como a preocupação de inclusão social do deficiente em situação de igualdade a exemplo de outras minorias étnicas e religiosas datam de mais de 30 anos (MERCADANTE, 2004). Contudo os resultados práticos deste reconhecimento não foram perceptíveis nesse período. Infelizmente a história mostra que o portador de deficiência sempre recorreu ao esforço individual para superar obstáculos à sua real inclusão e aceitação na sociedade, exemplos como Franklin Roosevelt (ex-presidente americano paraplégico), Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (famoso escultor mineiro), ou mesmo o cantor Stevie Wonder (cego de nascença), são exceções no meio e, predominantemente, se destacam por talentos e habilidades individuais que sobressaem, mesmo quando comparados a pessoas ditas “normais”.
(…)
Assim, a adaptabilidade dos acessos, ou simplesmente acessibilidade, contribui efetivamente para a auto-suficiência do portador de necessidades especiais, à medida que permite ao indivíduo desempenhar sua atividade profissional, desenvolver-se cultural e economicamente, sem depender de outro indivíduo e conseqüentemente reduzindo as barreiras à integração a partir da percepção coletiva de que a deficiência não representa, em sua totalidade, uma incapacidade ou tampouco um limitador das habilidades deste portador.
(…)
Assumindo a importância e interpretando este conceito de acessibilidade aos recursos computacionais que disponibilizam diversas informações e serviços por meios eletrônicos, a igualdade do portador da deficiência será garantida ao prover autonomia e/ou facilidades na utilização deste meio para realizar atividades triviais do dia a dia, como fazer compras pela Internet, pagar contas, “baixar” músicas, etc.
Segundo o “Manual de acessibilidade para agências bancárias” (FEBRABAN, 2006):
Apesar de existirem leis e normas que garantam acessibilidade, esta é uma questão muito mais ligada à conscientização e a sensibilidade para compreender os benefícios de uma arquitetura inclusiva pensada para todos.

Para os bancos a questão da acessibilidade tem uma importância significativa.
A falta dela gera:
(1) Impossibilidade de atendimento a uma parcela considerável da população;
(2) Sensação de esquecimento e desconforto;
(3) Situações constrangedoras;
(4) Exclusão social;
(5) Prejuízo financeiro com pagamento de multas;
(6) Prejuízo na imagem institucional.
Por outro lado um ambiente acessível garante:
(1) respeito ao direito de ir e vir e a prática da cidadania;
(2) condições adequadas para a prestação de um atendimento de qualidade;
(3) novos consumidores e fidelização de antigos clientes;
(4) reconhecimento como uma empresa cidadã que exerce suas responsabilidades sociais;
(5) inclusão social.

6. Numa outra vertente, deve ser considerada a aplicabilidade da Lei 8.078/90 ao caso, conforme explicitado na sentença:
(…)
A Lei 8078/90, inovadora e de grande evolução quanto ao conceito de consumidor, é muito superior à citada Lei 10.098, embora esta seja posterior, e a Resolução 2878. A Lei 10.098 deve adaptar-se ao Código de Defesa do Consumidor e não o contrário. O Banco Bradesco S.A., a maior instituição financeira privada do país, com lucros recordes de conhecimento geral chegou ao absurdo de nesta audiência sugerir que o autor procure outro banco que atenda suas necessidades, ao passo que até mesmo politicamente seria mais viável atender a todos os consumidores dos seus serviços, sem exceção, do que desprezá-los e recomendar que procure outra instituição. Cabe ao banco, que se propôs a prestar os serviços bancários, se adaptar às exigências do consumidor de seus serviços, e não o contrário. Não é o consumidor que deve se adaptar ao que o banco tem a dispor. O Código de Defesa do Consumidor, ao assegurar que este seja atendido de forma regular e eficaz, arrima a pretensão autoral e deve prevalecer, como já dito, pela mencionada Lei e Resolução constantes da contestação. Trata-se de responsabilidade civil objetiva, em que não há necessidade de demonstração do ato ilícito, que configura-se com a existência de uma ação, a violação da ordem jurídica, a imputabilidade e a penetração da esfera de outra, ainda assim não se eximiria o banco suplicado de sua responsabilidade. É que ter-se-ia como ato ilícito a ação do banco suplicado, mesmo não havendo a exigência contida na Lei 10.098, o fato de não dispor de todos os seus serviços a todos os correntistas. (fl. 137).
Conforme noticiado no acórdão reclamado, à fl. 238, o próprio recorrente está providenciando a adaptação de seus caixas eletrônicos para melhor atendimento aos portadores de deficiência física. Portanto, suporte financeiro e tecnológico existem, de forma que não há justificativa a que o recorrente procure subtrair-se ao seu dever legal e constitucional.

7. Por fim, assinale-se o que dispõe a ABNT-NBR 15250 de 2005, que trata da acessibilidade em caixa de auto-atendimento bancário e as referências normativas nela indicadas:
1. (…)
1.1 Esta Norma fixa os critérios e parâmetros técnicos de acessibilidade a serem
observados quando do projeto, construção, instalação e localização de equipamentos destinados à prestação de informações e serviços de auto-atendimento bancário.
1.2 Para o estabelecimento desses critérios e parâmetros técnicos foram consideradas diversas condições de mobilidade e de percepção, com ou sem a ajuda de aparelhos específicos, sejam eles: sistemas assistidos de voz, cadeira de rodas ou outro que complemente necessidades individuais.

8. Provejo, contudo, a insurgência atinente à multa do artigo 538 , parágrafo único do CPC, aplicada pelo Tribunal recorrido em face da oposição dos embargos declaratórios pelo banco recorrente. À toda evidência que, no caso, os aclaratórios não tiveram intuito procrastinatório assinalado pelo acórdão a quo pois visavam unicamente o prequestionamento da legislação infraconstitucional
dita violada. Afasto a multa aplicada.

9. Ante o exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe parcial provimento apenas para afastar a multa do artigo 538, parágrafo único do CPC.

É como voto.” Exmo. Ministro Luis Felipe Salomão

Portanto, a parte autora, deficiente visual, tem razão ao exigir que o banco Réu emita o cartão nº 4341.5577.85743-01, para pagamento eletrônico de benefícios previdenciários, em linguagem em Braile; efetue as adaptações necessárias nos caixas eletrônicos, possibilitando a sua utilização, independentemente da ajuda de terceiros, ao menos na agência onde a autora efetua o saque do benefício a que sua irmã faz jus, e por fim, que a parte ré emita os extratos bancários, faturas, comprovantes de transações realizadas nos caixas eletrônicos ou quaisquer outros documentos impressos em Braile, assim como disponibilize a utilização de fones de ouvido para fornecimento de informações necessárias à prestação dos serviços, de acordo com a Lei nº 10.098/2000, o Dec. nº 5.296/2004 e a Lei Estadual nº 4.265/2004.

A omissão da ré no cumprimento da Lei nº 10.098/2000, do Dec. nº 5.296/2004 e da Lei Estadual nº 4.265/2004, traduz falha na prestação dos serviços e impõe à parte ré o dever de reparar o dano causado à autora, o qual vem ocorrendo in re ipsa, conforme dispõe o art. 14 do CDC. A fixação do valor devido a título de indenização pelo dano moral deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, pois se impõe, a um só tempo, reparar a lesão moral sofrida pela parte autora sem representar enriquecimento sem causa e, ainda, garantir o caráter punitivo-pedagógico da verba, pois a indenização deve valer, por óbvio, como desestímulo à prática constatada.

Pelo exposto, julgo procedente em parte o pedido para condenar a reclamada a:
1) emitir o cartão bancário nº 4341.5577.85743-01, em linguagem em Braile;
2) efetuar as adaptações necessárias nos caixas eletrônicos, possibilitando a sua utilização, independentemente da ajuda de terceiros, ao menos na agência onde a autora efetua o saque do benefício a que sua irmã faz jus;
3) emitir os extratos bancários, faturas, comprovantes de transações realizadas nos caixas eletrônicos ou quaisquer outros documentos impressos em Braile;
4) disponibilizar a utilização de fones de ouvido para fornecimento de informações necessárias à prestação dos serviços,
5) estas obrigações contidas nos itens 1 a 4 deverão ser cumpridas no prazo de até 60 dias, a contar da publicação desta, sob pena de multa diária de R$ 50,00 (cinquenta reais), por descumprimento de cada obrigação de fazer, na forma dos artigos 461, 644 e 645 do CPC
6) pagar à parte autora o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de indenização por danos morais, devidamente corrigido e acrescido de juros de mora na taxa de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data da publicação da sentença, devendo tal quantia ser depositada em até 15 (quinze) dias, a contar do trânsito em julgado desta, sob pena de multa de 10% do valor fixado na forma do art. 475-J do CPC c/c Enunciado Jurídico n° 08, oriundo do VIII Encontro de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais, publicado através do Aviso nº 36/2006.

Sem ônus sucumbenciais, em razão do art. 55 da Lei n. 9.099/95. Publique-se, registre-se e intimem-se. Após o trânsito em julgado da presente, dê-se baixa e arquive-se.

Rio de Janeiro, 25 de janeiro de 2011.

FLÁVIO CITRO VIEIRA DE MELLO
JUIZ DE DIREITO

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Site publicado em 04/05/2009
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