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Telemarketing e torpedos põem à prova a paciência do consumidor.

Telemarketing e torpedos põem à prova a paciência do consumidor.

 

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Consumidores reclamam de mensagens indesejadas no celular<br />
Foto: Marcelo Carnaval / Agência O Globo

Consumidores reclamam de mensagens indesejadas no celular Marcelo Carnaval

 

RIO – Se há uma unanimidade nacional é a falta de paciência do brasileiro com os abusos nas ligações de telemarketing e envio de torpedos que oferecem uma avalanche de produtos e serviços não solicitados. Escapar do operador do outro lado da linha ou bloquear os SMS indesejáveis, contudo, não é tarefa simples e exige determinação e uma verdadeira romaria por sites e números de telefone. No Brasil, apenas oito estados — São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Paraná, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Paraíba e Goiás —, fora o Distrito Federal, contam com leis específicas para coibir tais práticas.

Rio e São Paulo têm leis sobre o assunto, mas que, na prática, se mostram insuficientes diante do número de queixas e reclamações dos usuários. No Rio, a lei 4.863, de 2006, garante a privacidade do consumidor quanto ao direito de não receber mensagens sem autorização. Em São Paulo, a lei 13.226, de 2008, normatiza o assunto, mas só em relação às chamadas de telemarketing — a proposta para inclusão dos SMS ainda está sendo elaborada. A assessora técnica da Fundação Procon-SP, Patrícia Alvarez, diz que o usuário pode fazer pessoalmente o bloqueio do número desejado no site da entidade, atualizado diariamente. Uma vez formalizada a queixa, o responsável pelo número reclamado tem 30 dias para suspender as ligações. Passado esse prazo, se o contato continuar, a empresa pode receber multas que vão de R$ 600 a R$ 7 milhões. Desde 2010, quando a lei entrou em vigor, já foram autuadas 307 empresas.

Em âmbito nacional, a resolução 477 da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) regula o tema. A agência, contudo, não tem estatísticas separadas sobre queixas de SMS e telemarketing, mas garante que 80% dos casos são solucionados em cinco dias úteis, e 95% no prazo de um ano. Em 2013, a Anatel recebeu 1,3 milhão de reclamações, a maioria por cobranças indevidas.

Sigilo de dados não é respeitado, diz especialista

Segundo a Anatel, as operadoras de telefonia e TV paga têm um prazo de 120 dias, a contar de 10 de março deste ano, para informar de forma clara em seus sites os links para cancelamento automático de contrato e suspensão de envio de mensagens não autorizadas pelo cliente.

O diretor do Departamento Jurídico do Procon-RJ, Carlos Eduardo Amorim, diz que, para não ser importunado por mensagens publicitárias, o consumidor deve fazer constar, na assinatura do contrato com a operadora, que não deseja receber os SMS. Amorim alerta: ao receber no celular mensagem com mais de quatro dígitos, é quase certo que se trata de torpedo publicitário. As operadoras trabalham com três ou quatro dígitos.

— As reclamações têm crescido muito, a ponto de as ações apresentadas aos juizados especiais cíveis levarem mais tempo, às vezes, para serem julgadas do que na Justiça comum — diz.

Rosa Matsura, moradora do Maracanã, na Zona Norte do Rio, diz que desenvolveu uma tática própria para evitar as chamadas de telemarketing:

— Na minha secretária eletrônica, vejo o prefixo da ligação. Se não for do Rio, não atendo. O problema é que, mesmo assim, deixam recado com ofertas de um monte de coisas que não me interessam.

Sheila Cruz, aeronauta e moradora do Leme, na Zona Sul, diz que já perdeu a conta do tempo perdido recebendo ofertas de cartão de crédito, planos de saúde, planos de TV por assinatura, horóscopo, notícias e até filtro purificador de água.

— Eles ligam o dia inteiro, até à noite. Já tentei cancelar essas mensagens junto à Vivo, mas eles dizem que não podem suspender o serviço, porque consta do contrato — queixa-se Sheila.

Os operadores de telemarketing também reclamam. O diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações (Sinttel), Luiz Antonio Souza da Silva, diz que o abuso nas ligações prejudica os próprios operadores, que são submetidos a uma pressão grande para cumprir metas. Segundo ele, a categoria é mal remunerada e tem muitos casos de afastamento do trabalho por motivos de saúde:

— O telemarketing hoje é praticamente terceirizado em todo o país. Duas empresas empregam 250 mil pessoas em todo o Brasil, 30 mil só no Rio. O sindicato também é contra esses abusos nas ligações. O fato é que falta fiscalização. Existe um comércio de venda de cadastros telefônicos, todo mundo sabe disso, mas ninguém faz nada.

O presidente do Instituto Brasileiro de Relações com o Cliente (IBRC), Alexandre Diogo, atribui a resistência às mudanças ao forte lobby político que as empresas de telemarketing têm no Brasil e ao reduzido número de estados que contam com legislação própria para inibir essas práticas.

— Em São Paulo, por exemplo, a lei que normatiza as ligações de telemarketing foi aprovada pela Assembleia e vetada pelo Executivo. Só passou a valer porque o veto foi derrubado pelos parlamentares. Além disso, Procon estadual não pode notificar operadora de telemarketing com sede em estado que não tenha essa legislação. É um imbróglio jurídico.

Diogo não vê necessidade de leis complementares, já que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) considera essas práticas abusivas. Mas considera que o consumidor deve ser mais proativo e não ficar esperando que só o governo resolva problemas, com a criação de blogs que denunciem e identifiquem empresas, com boicote a produtos e serviços das companhias.

Segundo o presidente do IBRC, mais importante seria a pressão para que as empresas revelassem como obtiveram o contato do usuário:

— O sigilo de dados não é respeitado no Brasil. É algo negociado como se fosse marca de bife. Eu mesmo recebo por dia de dez a 12 torpedos .

A presidente do Procon Brasil, Gisela Simona, diz que as dificuldades de bloqueio de celulares e telemarketing mostram a situação de fragilidade do consumidor em relação a seus direitos:

— A aprovação do Marco Civil da Internet deveria ensejar um debate no Congresso sobre o tema.

A Claro afirma estar se adequando para cumprir as regras do novo regulamento da Anatel. Sobre o cancelamento de mensagens publicitárias, a empresa afirma já cumprir as determinações.

A TIM diz que faz o cadastro para bloqueio de ligações de telemarketing nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Paraná, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Paraíba e no Distrito Federal e que os clientes podem recusar contatos da operadora, como telemarketing, torpedos promocionais e e-mail marketing.

A Telefônica Vivo informa cumprir a regra de envio de publicidade apenas com autorização prévia do consumidor, oferecendo no contrato a opção de recebimento ou não de conteúdo via SMS. Já a Oi diz cumprir a norma da Anatel sobre ligações e envio de mensagens promocionais e que casos de dificuldades no cancelamento de chamadas e SMS serão apurados pela empresa. A GVT, por sua vez, afirma que os procedimentos para cancelamento do contrato estão no site.

O que fazer

SMS e ligações. A resolução 477 da Anatel, de 2007, e a lei estadual 4.863, de 2006, garantem ao cliente optar por receber ou não mensagens de texto e solicitar a suspensão do serviço. Queixas pelo telefone 1331 ou no site da agência (www.anatel.gov.br).

Contrato. A Anatel aprovou, em 20 de fevereiro, norma que garante, a partir de julho, cancelamento automático do contrato de telefonia, banda larga ou TV por assinatura. A operadora terá até dois dias úteis para efetivar a decisão. Em cancelamento via atendente, o serviço deve ser encerrado de imediato.

Claro. Para cancelar o recebimento de mensagens e serviços, o cliente deve enviar a palavra “sair” para 888, ou solicitar o bloqueio pelo canal 1052.

TIM. Sobre torpedo/SMS promocional, o cliente pré-pago é perguntado se quer recebê-los ao realizar a primeira ligação. Também é possível solicitar bloqueio enviando SMS com a palavra “sair” para o 4112 ou ligando para *144.

Oi. Basta enviar SMS com a palavra “sair” para o número 55555 ou desativar o serviço pelo portal de relacionamento Minha Oi.

Vivo. O cancelamento de SMS pode ser feito pelo portalwww.vivo.com.br, pelo *8486, nas lojas e até por SMS.

GVT. Suspensão do contrato pode ser feita pelo sitewww.gvt.com.br/portal/site/minhagvt/faleComGvt.

MARIO RUSSO (EMAIL)

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Site publicado em 04/05/2009
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