Flávio Citro - Direito Eletrônico

Sites que vendem ingressos ainda abusam da taxa de conveniência descumprindo a Lei Estadual 6.103 de 8 de dezembro de 2011

Lei estabelece regras claras para a cobrança, mas é ignorada por empresas e cidadãos do Rio

Alguns sites cobram taxa de entrega até para quem vai buscar o ingresso na bilheteria Reprodução

RIO – No dia 8 de dezembro do ano passado, o governador do Rio, Sérgio Cabral, sancionou uma lei, publicada no Diário Oficial do estado, que deveria ter alterado drasticamente a venda de ingressos pela internet, mas que, até agora, vem sendo ignorada tanto pelas empresas que atuam nesse mercado quanto pelos cidadãos que fazem uso desse serviço.

Com apenas sete artigos (de não mais de uma frase cada um), a enxuta lei estadual 6.103/11, que passou incólume por todas as comissões da Assembleia Legislativa do Estado do Rio (Alerj), determina que a chamada taxa de conveniência — o valor cobrado pelos sites para realizar a venda on-line de uma entrada de cinema, teatro ou show, por exemplo — só pode ser cobrada “uma única vez, para cada consumidor, independentemente da quantidade de convites” adquirida. Ela estabelece ainda que a taxa não pode “possuir qualquer relação com o valor do ingresso” e que tampouco pode “variar de espetáculo para espetáculo dentro do mesmo site”. O valor da taxa em si pode ser arbitrado por cada site.

Na opinião de especialistas e defensores dos direitos do consumidor, a lei 6.103/11 foi uma grande conquista. Na última semana, no entanto, um passeio por três dos principais sites de vendas de ingressos do país levava à constatação de que a norma estadual — que protege qualquer cidadão residente em território fluminense — só tem tido a função de fazer crescer a pilha das leis que não colam.

Em SP, R$ 4,8 milhões em multas

Na sexta-feira, o estudante que acessou o Ingresso.com para adquirir uma entrada para o show que Marcelo Camelo fez no sábado no Rio pagou R$ 4,80 de taxa de conveniência, a metade do que foi desembolsado pelo fã que não tinha direito à meia-entrada. Segundo previsto no artigo 4 da 6.103/11, esta é uma prática ilegal.

A Ticket for Fun, por sua vez, cobrava R$ 18 de taxa de conveniência para processar a venda de um ingresso para o show de Ana Carolina, dia 23, no Citibank Hall. Essa soma é equivalente a um terço do que a mesma página cobrava dos interessados em assistir a Roger Waters no Engenhão, no dia 29.

A Ingresso Rápido também descumpria a lei 6.103/11 na semana passada. Na página em que o consumidor enxerga seu “carrinho de compras”, por exemplo, a empresa mostra que aplica uma taxa de conveniência sobre cada entrada vendida. Isso significa, por exemplo, que o cliente interessado em comprar quatro entradas para ver a banda australiana Air Supply no dia 20, no setor 2 do Vivo Rio, precisa pagar R$ 660,80 (R$ 560 pelos ingressos + R$ 100,80 de conveniência) em vez de R$ 585,20 (R$ 560 das entradas + uma única taxa de R$ 25,20).

— Por se tratar de uma questão de direito do consumidor, não existe a possibilidade de as empresas alegarem que a lei estadual é inconstitucional — ressalta Rodrigo Terra, promotor de Justiça no Rio. — No Brasil, tanto a União quanto os estados e os municípios têm competência jurídica para legislar sobre o assunto. O que vemos agora é mais um capítulo de uma briga antiga que passa, sobretudo, pela caracterização do que é ou não conveniência.

Em 2008, por conta da venda de ingressos feita pela Ticket for Fun para o show de Madonna, Terra moveu uma ação contra a empresa por venda casada — a compra da entrada só podia ser feita por meio do pagamento da conveniência. O caso acaba de ser julgado em segunda instância, e o Ministério Público do Rio ganhou a causa. Esta é apenas uma das brigas que Terra vem comprando contra a taxa de conveniência.

Sem uma legislação específica, amparados apenas pelo Código de Defesa do Consumidor, os paulistas também registram casos de cobrança indevida. Segundo o Procon de São Paulo, em dez anos a entidade moveu 30 processos administrativos contra os cinco maiores sites de vendas de ingressos que atuam no mercado local. Recolheu R$ 4,8 milhões em multa, mas as práticas ilegais persistem.

— O que acontece é que as empresas recebem as autuações, pagam as multas e preferem continuar lesando o consumidor a se adaptar — explica Renan Ferraciolli, diretor de fiscalização do Procon-SP. — Estamos diante de diversos casos de reincidência, e essas empresas estão, agora, sujeitas a ter seus direitos de comercialização de ingressos suspensos.

Segundo Ferraciolli, acontecerá na próxima sexta-feira, na sede do Ministério Público Estadual de São Paulo, uma reunião — considerada “a última tentativa de diálogo” — com os responsáveis por diversos sites do setor. Se o grupo não se adequar, estará sujeito a processos administrativos.

Lei protege moradores do Rio

No estado do Rio, qualquer morador que se sentir lesado pela cobrança de taxa de conveniência pode recorrer ao Procon — tanto antes quanto depois da compra da entrada em questão, informa a consultora jurídica da entidade Maria Rachel Coelho.

— Ele pode ligar para o 151 ou procurar nossos postos de atendimento para registrar o caso — ressalta. — Vale lembrar que o direito do consumidor toma como referência o endereço de domicílio do cidadão que se sente lesado. Ou seja, se um morador do estado do Rio resolver comprar um ingresso de um show que acontecerá em Porto Alegre, num site de São Paulo, por exemplo, tem o direito de se valer da lei estadual daqui sobre a taxa de conveniência. No que diz respeito a isso, o Rio está na vanguarda, e seu cidadão precisa agir como agente fiscalizador.

Procurados pela reportagem para comentar a lei 6.103/11 e explicar como chegam aos valores de suas taxas de conveniência, dois dos três sites analisados responderam por meio de notas oficiais.

O Ingresso Rápido informou que “oferece conforto e comodidade aos consumidores interessados por outros canais de venda que não sejam a tradicional bilheteria do local do evento” e que “a lei 6.103 é recente, e sua interpretação ainda não foi consolidada”. Já a Ingresso.com escreveu que, “dada a complexidade da matéria”, aguardará que ela seja “devidamente dirimida pelo Poder Judiciário”. O site Tickets for Fun, por sua vez, não retornou o pedido de entrevista do GLOBO.

Cristina Tardáguila

Atualizado: 15/03/12 -
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LEI Nº 6103, DE 08 DE DEZEMBRO DE 2011.

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DISPÕE SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DA COBRANÇA DE TAXA DE CONVENIÊNCIA PELAS EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇO DE VENDA DE INGRESSOS PELA INTERNET OU TELEFONE NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
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        O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
        Faço saber que a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

    Art. 1º Fica regulamentada a cobrança da Taxa de Conveniência pelas empresas prestadoras de serviço de venda de ingressos pela internet ou telefone no Estado do Rio de Janeiro.

    §1º Tem-se por Taxa de Conveniência a prestação de serviço de venda de ingressos para show, teatro, cinema e outros espetáculos pela internet ou telefone, em conjunto com a possibilidade do consumidor em imprimir o seu ingresso ou retirá-lo em guichê específico para este fim.

    §2º A taxa de Conveniência não corresponde à entrega do ingresso em domicílio, ficando a critério do consumidor a contratação em separado deste serviço.

    Art. 2º V E T A D O.

    Art. 3º A venda de ingressos pela internet ou telefone com a cobrança da Taxa de Conveniência deve ser realizada, concomitantemente, com a abertura dos postos de venda.

    Art. 4º O custo da taxa de conveniência deve ser fixo para os eventos disponíveis, não podendo possuir qualquer relação com o valor do ingresso comercializado, nem com o setor/local escolhido pelo cliente para assistir o espetáculo, devendo o fornecedor deste serviço oferecer ao consumidor a informação prévia discriminada do valor desta taxa.

    §1º O valor da Taxa de Conveniência não pode variar de espetáculo para espetáculo dentro do mesmo site de venda.

    §2º O valor da Taxa de Conveniência é cobrado por compra realizada, uma única vez, para cada consumidor, independentemente da quantidade de convites e/ou ingressos adquiridos.

    Art. 5º O estabelecimento ou prestador de serviço que infringir esta Lei ficará sujeito às sanções previstas no artigo 56 da Lei federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 – Código de Defesa do Consumidor, aplicáveis na forma de seus artigos 57 a 60.

    Art. 6º Os prestadores de serviço de conveniência deverão disponibilizar cópia na íntegra da presente Lei em seu site de vendas.

    Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

    Rio de Janeiro, em 08 de dezembro de 2011.

    SÉRGIO CABRAL
    GOVERNADOR

    Hide details for Ficha TécnicaFicha Técnica

    Projeto de Lei nº 50-A/2011 Mensagem nº
    Autoria CLARISSA GAROTINHO
    Data de publicação 09/12/2011 Data Publ. partes vetadas
    Tipo de Revogação Em Vigor

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    Site publicado em 04/05/2009
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