Flávio Citro - Direito Eletrônico

Compra Fácil pagará R$ 10 mil de multa diária se continuar a desrespeitar consumidores

O juiz da 4ª Vara Empresarial da Capital, Mauro Pereira Martins, concedeu liminar na ação civil pública proposta pelo Ministério Público contra a Hermes, também conhecida por Compra Fácil, que atua no mercado de varejo on-line. A empresa foi condenada a pagar multa diária de R$ 10 mil (dez mil reais) caso descumpra a decisão de respeitar os direitos de seus consumidores.

Confome a decisão, a empresa terá que cumprir todos os seus contratos de compra e venda, o prazo estipulado para a entrega de seus produtos; se abster de divulgar, em todas as suas ofertas publicitárias, principalmente nos sites de venda, produtos e serviços que não estejam em estoque, ou quando divulgados nessas condições, fazer constar de forma clara e destacada, a informação de que o produto está indisponível no estoque; vender produtos de acordo com as informações divulgadas nos anúncios publicitários; e realizar um serviço de pós venda mais eficaz e veloz ao consumidor; tudo isso sob pena de multa diária de R$ 10 mil reais.

Segundo a inicial do órgão ministerial, consta no site da Hermes que sua meta é oferecer aos clientes uma experiência de compra diferenciada e conveniente, com serviço 24 horas, segurança total e com atendimento sem igual.  Entretanto, ainda segundo o MP, são inúmeras as reclamações feitas por consumidores no serviço de sua Ouvidoria, demonstrando que o serviço prestado é de baixíssima qualidade, sem segurança nenhuma quanto ao sucesso das compras, e  atendimento pós-venda  péssimo.

Na decisão, o juiz Mauro Pereira Martins salientou que consta dos autos a referência a várias reclamações formuladas pelos clientes da Hermes que se afirmam lesados.  “Há indicações que a instituição demandada vem, muito provavelmente e com grande freqüência, descumprindo direitos de consumidores quando do fornecimento de produtos”, explica o magistrado.  E ainda: “Valendo, outrossim, mencionar que o elevado número de reclamações indica que o fato assinalado não consiste em situações isoladas. O perigo de dano para os consumidores é evidente, pois os mesmos ficam privados dos produtos ou de seu uso regular, somente sendo atendidos após reclamarem para os órgãos de defesa de consumidores”.  

Notícia publicada em 15/07/2011
 Exmo. Juiz de Direito da a Vara Empresarial da Comarca da Capital

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, por intermédio do Promotor de Justiça que ao final subscreve, vem, com fundamento nas Leis 7.347/85 e 8.078/90, ajuizar a competente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido de liminar

contra a SOCIEDADE COMERCIAL E IMPORTADORA HERMES S/A (“COMPRA FÁCIL”), inscrita no CNPJ sob o nº 33.068.883/0001-20, com sede à Rua Victor Civita, n° 77, bloco 01, sala 202 e 302, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro – RJ – Brasil, CEP 22.775-044, pelas razões que passa a expor:

I. PRELIMINAR

a) Legitimidade ativa do Ministério Público

O Ministério Público possui legitimidade ativa, pois no presente caso a COMPRA FÁCIL tem violado os interesses sociais e individuais indisponíveis dos seus consumidores. E, conforme o disposto no art. 127, caput e art. 129, III da CF, a instituição possui plena legitimidade para tutelar tais interesses.

Especificamente, o Ministério Público pretende com a presente ação proteger três tipos distintos de interesses, quais sejam: (i) interesse difuso; (ii) interesse coletivo; e (iii) interesse individual homogêneo.

Primeiramente, vale destacar que a COMPRA FÁCIL, sociedade anônima de capital fechado, é parte integrante da Hermes S/A, e atua no mercado de varejo on-line.

E, de acordo com o informado pelo site desta empresa1, sua meta é oferecer aos seus clientes uma experiência de compra diferenciada e conveniente, com serviço 24 horas, segurança total e com atendimento sem igual.

Todavia, não é este o resultado apresentado pelo COMPRA FÁCIL. Ao contrário, são inúmeras as reclamações feitas por consumidores no serviço de Ouvidoria do Ministério Público, demonstrando que o serviço prestado é de baixíssima qualidade, não há segurança nenhuma quanto ao sucesso das compras e o atendimento pós-venda é péssimo.

Veja, a seguir, algumas reclamações registradas pelo Inquérito Civil n° 63/2009 do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro:

“Segundo consta dos ‘e-mails’ copiados abaixo, meu concunhado Peter, que reside no Rio de Janeiro, participou de um programa dos correios que seleciona cartas de crianças pobres para a aquisição de um presente de natal. Uma criança foi ‘adotada’ para receber uma bicicleta, que foi adquirida com antecedência e diretamente do ‘site’ Comprafacil. No ‘site’ do Submarino o produto não estava disponível, conforme expressamente constava da página da Internet, razão pela qual o Comprafacil foi escolhido.

O pessoal do Comprafacil não fez essa ressalva. Resultado: até agora, quase um mês depois da data festiva (Natal), a criança continua sem o brinquedo, sendo que somente em 08.01.09 a empresa (ou a organização…) ofereceu outro produto em troca.” (fls. 02/03 do I.C. n° 63/2009) (Grifou-se)

“(…) venho denunciar a empresa do grupo Hermes (Compra Fácil), pois recebi uma revista em casa com preço de um produto R$ 119,80 e o produto no site tinha o valor de R$ 199,80. Estão literalmente me enrolando para não vender ao preço menor, tentando vencer pelo cansaço.” (fl. 93 do I.C. n° 63/2009) (Grifou-se)

“Em 06/05/2010 efetuei compra de um produto no site www.comprafacil.com, no valor de R$ 389,90, no cartão de crédito, com pagamento à vista. O fato é que, no momento da compra, é feita a pesquisa do CEP, para informar o valor do frete e o prazo de entrega, especificando que o prazo máximo de entrega, no meu caso, seria de 8 dias úteis, a contar da data de confirmação do pagamento, que ocorreu em 07/05/2010. Além disso, foi confirmado através de email gerado pela empresa que o prazo máximo se daria em 19/05/2010, até às 18h. Fiz algumas tentativas de contato via email com a empresa para obter informações sobre a demora na entrega, site esse gerado pela empresa, no momento da compra, em caso de dúvida. Mas nenhuma das vezes obtive resposta, fato que me levou a encaminhar todos os emails para a empresa, mas com cópia para meu email pessoal, o que provaria tentativas de contato. Não obtendo retorno algum, entrei em contato via chat, já que a empresa não possui nenhum telefone gratuito para contato/reclamação (…)”(fl. 96 do I.C. n° 63/2009) (Grifou-se)

“Gostaria de deixar evidente a minha indignação com a Compra Fácil, pois é a primeira vez que compro nesta loja virtual e tive o azar de ser muito mal atendida. E por não agüentar o pouco caso feito por esta empresa vim até aqui denunciar o ocorrido. Verifiquem abaixo pois estou nesta luta desde o dia 10/05/2010 e até o dia de hoje 26/05/2010 não obtive o sofá-cama que comprei. Recebi a mercadoria danificada (pedido n° 10792873), no dia 10/05/2010, telefonei para solicitar a troca (protocolo 2131805-Camila), e até o presente momento, ainda não recebi a confirmação de troca. Preciso desse móvel para a próxima semana e gostaria de informar que a 1a parcela já foi descontada no cartão de crédito (…)” (fl. 128 do I.C. n° 63/2009) (Grifou-se)

“(…) Em 06/05 registrei uma reclamação no site reclameaqui.com.br, detalhando todo o problema. Em 07/05 recebi retorno conforme segue: ‘Informamos que sua compra foi faturada, porém, sua condensadora não pôde ser expedida de nossa empresa, devido à indisponibilidade do produto em nosso estoque, devido a problemas junto ao fornecedor (…)” (fl. 123 do I.C. n° 63/2009) (Grifou-se)

“(…) Fiz o pedido via NET em 22/04/2010 com previsão de entrega em 8 dias úteis. Não entregaram, reclamei, pediram mais 3 dias úteis, nada, reclamei, pediram mais 48 horas e até agora nada. Pedi cancelamento e disseram que só podem cancelar depois que eu receber e recusar o pedido. Se até agora não chegou, não posso aguardar uma coisa que não chegará para só depois cancelar, é absurdo! (…)”(fl. 172 do I.C. n° 63/2009) (Grifou-se)

Dessa forma, percebe-se que a conduta da COMPRA FÁCIL tem a capacidade de violar os três diferentes tipos de interesses descritos acima.

Diz-se que há violação a direitos difusos, pois, no presente caso há direitos de natureza indivisível, cujos titulares são pessoas indetermináveis e ligadas por circunstâncias de fato (art. 81, I, CDC e art. 129, III, CF).2

Em outras palavras, a conduta da COMPRA FÁCIL de realizar propaganda enganosa (ofertar produtos a determinado preço e cobrar efetivamente outro, ou então anunciar a venda de um produto, vendê-lo, e depois alegar que não tem no estoque), tem o potencial de, futuramente, lesar uma quantidade indeterminável de consumidores que serão atraídos pelos anúncios caluniosos e sofrerão prejuízos econômicos certos.

Além disso, o Ministério Público visa tutelar interesses coletivos, pois no presente caso há interesses transindividuais indivisíveis de um grupo determinado ou determinável de pessoas, reunidas por uma relação jurídica base comum (art. 81, II, CDC e art. 129,III, CF).3

Isto é, o não cumprimento do contrato de compra e venda e entrega de produtos pela COMPRA FÁCIL afetou o interesse coletivo e indivisível dos consumidores (grupo determinável de pessoas) que ou não receberam o produto devidamente pago, ou então o receberam com algum defeito.

Por fim, o Ministério Público objetiva tutelar interesses individuais homogêneos, pois no caso há interesses divisíveis de um grupo de pessoas determinadas ou determináveis, de origem comum, e oriundo das mesmas circunstâncias de fato (art. 81, III, CDC).4

Em outras palavras, a prática da COMPRA FÁCIL de fornecer um serviço inadequado e ineficiente tem afetado de maneira individual e variável cada pessoa do grupo de consumidores dela, que residem em todo o país, especialmente no Estado do Rio de Janeiro.

Portanto, estão presentes os elementos suficientes para justificar a legitimidade ativa do Ministério Público para propositura da presente ação, vide art. 81, parágrafo único, II e III c/c art. 82, I, da Lei nº. 8078/90, assim como do art. 127, caput e art. 129, III da CF.

Inclusive, este vem sendo o posicionamento da jurisprudência, sobretudo a do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DIREITO INDIVIDUAL HOMOGÊNEO. LEGITIMIDADE E INTERESSE PROCESSUAIS CONFIGURADOS.

- O Ministério Público tem legitimidade processual extraordinária para a propositura de ação civil pública objetivando a cessação de atividade inquinada de ilegal de captação antecipada de poupança popular, disfarçada de financiamento para compra de linha telefônica.

- Não é da natureza individual, disponível e divisível que se retira a homogeneidade de interesses individuais homogêneos, mas sim de sua origem comum, violando direitos pertencentes a um número determinado ou determinável de pessoas, ligadas por esta circunstância de fato.

Inteligência do art. 81, CDC.

- Os interesses individuais homogêneos são considerados relevantes por si mesmos, sendo desnecessária a comprovação desta relevância.

Precedentes.

Recurso especial provido.

(REsp 910.192/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/02/2010, DJe 24/02/2010). (Grifou-se).

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TELEFONIA MÓVEL. CLÁUSULA DE FIDELIZAÇÃO. DIREITO CONSUMERISTA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ARTS. 81 E 82, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 129, III, DA CF. LEI COMPLEMENTAR N.º 75/93.

ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO OU QUAISQUER DOS ENTES ELENCADOS NO ARTIGO 109, DA CF/88. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.

ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DO ARTIGO 273, DO CPC. SÚMULA 07/STJ. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA.

VIOLAÇÃO DO ART. 535, I e II, DO CPC. NÃO CONFIGURADA.

(…)
3. A nova ordem constitucional erigiu um autêntico ‘concurso de ações’ entre os instrumentos de tutela dos interesses transindividuais e, a fortiori, legitimou o Ministério Público para o manejo dos mesmos.

4. O novel art. 129, III, da Constituição Federal habilitou o Ministério Público à promoção de qualquer espécie de ação na defesa de direitos difusos e coletivos não se limitando à ação de reparação de danos.

5. Hodiernamente, após a constatação da importância e dos inconvenientes da legitimação isolada do cidadão, não há mais lugar para o veto da legitimatio ad causam do MP para a Ação Popular, a Ação Civil Pública ou o Mandado de Segurança coletivo.

6. Em conseqüência, legitima-se o Parquet a toda e qualquer demanda que vise à defesa dos interesses difusos e coletivos, sob o ângulo material ou imaterial.

7. Deveras, o Ministério Público está legitimado a defender os interesses transindividuais, quais sejam os difusos, os coletivos e os individuais homogêneos.

8. Nas ações que versam interesses individuais homogêneos, esses participam da ideologia das ações difusas, como sói ser a ação civil pública. A despersonalização desses interesses está na medida em que o Ministério Público não veicula pretensão pertencente a quem quer que seja individualmente, mas pretensão de natureza genérica, que, por via de prejudicialidade, resta por influir nas esferas individuais.

9. A assertiva decorre do fato de que a ação não se dirige a interesses individuais, mas a coisa julgada in utilibus poder ser aproveitada pelo titular do direito individual homogêneo se não tiver promovido ação própria.

10. A ação civil pública, na sua essência, versa interesses individuais homogêneos e não pode ser caracterizada como uma ação gravitante em torno de direitos disponíveis. O simples fato de o interesse ser supra-individual, por si só já o torna indisponível, o que basta para legitimar o Ministério Público para a propositura dessas ações.

(…)
20. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.

(REsp 700.206/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 19/03/2010). (Grifou-se).

II. FATOS

A COMPRA FÁCIL é uma sociedade empresária, cujo objeto social é comercializar produtos no mercado varejista on-line. Para tanto, ela oferta seus bens no site oficial da empresa5, e os vende mediante contratos de consumo que pressupõem a entrega da mercadoria em momento posterior à celebração do negócio jurídico.

Ocorre que a COMPRA FÁCIL vem incessantemente desrespeitando as regras contratuais, já que (i) não cumpre com os prazos previamente estipulados para entrega dos bens; (ii) não pratica os preços determinados em anúncios; (iii) não presta serviços com segurança para os consumidores, que recebem produtos danificados; e (iv) vende produtos que não possui em estoque.

Todas essas práticas violam não só o contrato entre as partes, como também as regras de proteção aos consumidores previstas no CDC, tais como: (i) dever de prestar serviço adequado e eficiente; (ii) dever de prestar informações corretas aos consumidores; (iii) dever de boa-fé e equilíbrio nas relações contratuais; e (iv) respeito ao direito de arrependimento dos consumidores.

Vale dizer, que o Inquérito Civil n° 63/2009 instaurado pela 4a Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva e Defesa do Consumidor e do Contribuinte do Rio de Janeiro reuniu diversas declarações feitas pelos consumidores na Ouvidoria do Ministério Público, comprovando assim as afirmações feitas acima.

Nesse contexto, o Ministério Público resolveu por encaminhar uma proposta de Termo de Ajustamento de Conduta à COMPRA FÁCIL para que a mesma deixasse de lesar os interesses dos consumidores (fls. 184/186 do I.C. n° 63/2009).

Ocorre que a COMPRA FÁCIL não concordou com a proposta, obrigando o Ministério Público a ajuizar a presente ação civil pública para que não haja maiores lesões aos consumidores do que as já constadas.

III. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

a) Enriquecimento ilícito

Cabe destacar, primeiramente, que a conduta ilícita da COMPRA FÁCIL descrita no capítulo II viola o art. 39, V, CDC, uma vez que ela exige dos seus consumidores vantagem desproporcional.

Explica-se: quando a COMPRA FÁCIL vende um produto e deixa de entregá-lo no prazo estipulado, ela exige que o consumidor pague pelo produto pontualmente, mas não remunera o uso do capital investido.

Só que essa prática onera excessivamente o consumidor que não tem nenhuma contrapartida no negócio jurídico estabelecido. Ele apenas tem o dever de pagar pelo produto e nada a receber pelo capital “emprestado” à empresa.

Salienta-se que esta prática é desproporcional, pois todo capital tem seu custo, devendo ser remunerado para tanto. Só que a COMPRA FÁCIL além de não pagar por este custo, ainda impõe a demora na entrega do produto, resultando em manifesto enriquecimento ilícito, o qual é expressamente condenado pelo ordenamento jurídico nacional (vide art. 884,CC).

Vale lembrar, que a COMPRA FÁCIL, mesmo sabendo das dificuldades para entrega do bem comprado pelo consumidor, não o assegura sequer o direito de arrependimento. Como já disposto no capítulo I, há reclamações na Ouvidoria do Ministério Público comprovando que o consumidor pede para que a compra seja cancelada, mas a empresa se recusa, violando nitidamente o previsto no art. 49, CDC.

Assim é fácil perceber a má-fé do réu, que mesmo sabendo da impossibilidade de adimplir com o contrato, não permite que o consumidor encontre meios alternativos de solucionar o problema (direito de arrependimento, por exemplo).

Em suma, a COMPRA FÁCIL tem enriquecido ilicitamente e onerado excessivamente os consumidores, devendo, portanto, ser obrigada a readequar sua conduta ilícita e a indenizar os consumidores lesados pela retenção indevida de capital por prazo não estipulado previamente (art. 884, CC).

b) Violação a direitos básicos dos consumidores

A Lei n° 8.078 estabelece em seu art. 6° um rol de direitos básicos dos consumidores. Dentre eles, destaca-se três, quais sejam: (i) a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva; (ii) efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais; e (iii) a adequada e eficaz prestação de serviços públicos.

Além disso, o art. 14 do CDC estabelece que o fornecedor de serviços responde objetivamente pela reparação de danos causados ao consumidor por defeitos relativos à prestação do serviço. Sendo certo que estes defeitos estão relacionados à falta de segurança na prestação do serviço.

Por último, o art. 4° do CDC estipula que a Política Nacional das Relações de Consumo deve atender aos princípios da boa-fé e do equilíbrio das relações de consumo.

Pois bem, como se pode notar através dos fatos descritos no capítulo II, e das reclamações transcritas no capítulo I, a COMPRA FÁCIL tem desrespeitado todos os direitos elencados acima.

A conduta da COMPRA FÁCIL de não entregar as mercadorias pontualmente, ou de fornecer um produto defeituoso traz insegurança às relações consumeristas. Isso porque, o consumidor que paga pelo produto espera recebê-lo da forma como contratou, i.e., com as mesmas características e no prazo acordado. Só que se isso não acontece, gera-se uma insegurança na relação jurídica, prejudicando a parte mais fraca, que é o consumidor.

Além disso, ressalta-se que a empresa anuncia em seu site produtos com valor especial, caso pague-se à vista. Todavia, esse anúncio representa uma propaganda enganosa, já que o consumidor não paga somente aquilo anunciado, mas também pelo não uso do capital investido.

Em outras palavras, quando o consumidor paga à vista R$ 999,90 por uma TV LCD 26″ da Philco, e não tem o bem entregue no prazo estipulado, ele está pagando não só o valor anunciado, como também um valor adicional pelo não uso do dinheiro.

Sendo assim, a COMPRA FÁCIL também pratica o ilícito de propaganda enganosa, devendo ser compelida a modificar sua conduta e a entregar aquilo que efetivamente negociou, e de acordo com o preço que anunciou (vide art. 30, CDC).

Outro exemplo de propaganda enganosa realizada pela COMPRA FÁCIL é o anúncio divergente de preços para um mesmo produto em revistas e no site oficial.

De acordo com a reclamação de fl. 93 do I.C. n° 63/2009, também já transcrita no capítulo I, a empresa anunciou em uma revista um determinado produto a R$ 119,80, sendo que no site oficial da ré o mesmo produto custava R$ 199,80. Ao tentar adquirir o produto pelo valor mais baixo, o consumidor foi vetado, o que demonstra claramente a prática abusiva de propaganda enganosa.

Em seguida, cabe destacar que a COMPRA FÁCIL tem prestado um serviço pós venda extremamente ineficiente e inadequado. Conforme registrado pela Ouvidoria do Ministério Público, há diversas reivindicações de consumidores de que a empresa demora a responder emails de reclamação, não possui um sistema de atendimento ao consumidor gratuito, e não traz soluções rápidas aos problemas apresentados.

Dessa forma, a empresa viola também o direito dos consumidores de receber um serviço adequado e eficiente.

E, por fim, vale destacar que a conduta da COMPRA FÁCIL, invariavelmente, está eivada de má-fé, visando sempre o desequilíbrio da relação contratual. Diz-se isso, pois são inúmeros os casos em que a empresa prometeu entregar a mercadoria em uma determinada data, mas só a realizou efetivamente dias ou até meses depois, e sempre mediante repetidas reclamações dos consumidores.

Perceba-se que se houvesse boa-fé na conduta da empresa, ou o fornecedor dos produtos já teria sido substituído, ou então a COMPRA FÁCIL teria adotado meios mais diligentes e cuidadosos de solucionar o problema, como por exemplo: divulgar de forma clara e destacada nos sites de venda a informação de que o produto está indisponível em estoque. Só que não é isso que ocorre normalmente.

Enfim, como se pode notar, a COMPRA FÁCIL desrespeita sem nenhum pudor os direitos fundamentais dos consumidores, os quais estão expressos no CDC. E, por isso, deve indenizá-los por essas perdas e, ao mesmo tempo, modificar sua conduta ilícita para que futuros consumidores não sejam lesados.

c) Danos coletivos

É importante afirmar que a conduta ilícita da COMPRA FÁCIL gerou danos coletivos, materiais e morais, e, por isso, a mesma deve ser compelida a ressarci-los.

Não se pode negar que alguns dos direitos violados pela COMPRA FÁCIL são de natureza transindividual e indivisível. Isso porque, interesses difusos e interesses coletivos foram atingidos ao mesmo tempo pela divulgação enganosa de produtos, pela venda de produtos que não existiam em estoque e pela demora na entrega de mercadorias.

Em relação aos direitos difusos, pode-se dizer que um número indeterminável de pessoas, todas ligadas por uma mesma circunstância fática (publicidade enganosa), estiveram expostas a informações não verídicas, o que pode ter-lhes causado danos materiais (compra de bens com valores diferentes dos anunciados) e moral (estímulo à compra de produtos através de anúncios falaciosos). Portanto, o direito indivisível à informação correta e clara dessas pessoas foi violado pela conduta da COMPRA FÁCIL.

Da mesma forma, pode-se dizer que um número determinável de pessoas, todas ligas entre si pela mesma relação jurídica base (contrato de compra e venda de mercadorias), tiveram prejuízos materiais (compraram produtos que ou não foram entregues, ou então possuíam defeitos que os desqualificavam), bem como prejuízos morais (não puderam satisfazer suas necessidades atuais, como entregar presente no dia do Natal, por exemplo).

A conduta da ré, portanto, gera danos materiais e moral em sentido coletivo.

É importante frisar, com relação ao dano moral coletivo, que o mesmo está expressamente previsto no ordenamento jurídico nacional, de acordo com o disposto no art. 6º, VI e VII do CDC, bem como o art. 1°, II da Lei 7.347/85. Veja:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VI – a efetiva proteção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

VII – o acesso aos órgãos judiciários e administrativos, com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
(Grifou-se)

Art. 1º Regem-se pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

I – ao meio ambiente;

II – ao consumidor;

III – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;

V – por infração da ordem econômica e da economia popular;

VI – à ordem urbanística.

(Grifou-se)

O doutrinador Leornado Roscoe Bessa, em artigo dedicado especificamente ao tema do dano moral coletivo, corrobora a sua aplicabilidade às ações de proteção ao consumidor. Note:

“Além de condenação pelos danos materiais causados ao meio ambiente, consumidor ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, destacou, a nova redação do art. 1º, a responsabilidade por dano moral em decorrência de violação de tais direitos, tudo com o propósito de conferir-lhes proteção diferenciada”.6 (Grifou-se)

Como afirma o autor, a concepção do dano moral coletivo não pode estar mais presa ao modelo teórico da responsabilidade civil privada, de relações intersubjetivas unipessoais. Trata-se, nesse momento, de uma nova gama de direitos, difusos e coletivos, necessitando-se, pois, de uma nova forma de tutelá-los. E essa nova proteção se sobressai, sobretudo, no aspecto preventivo da lesão. Por isso, o dano moral coletivo é um mecanismo idôneo de punir comportamentos que ofendam ou ameacem direitos transindividuais.

Nas palavras do mesmo autor supracitado:

“Em face da exagerada simplicidade com que o tema foi tratado legalmente, a par da ausência de modelo teórico próprio e sedimentado para atender aos conflitos transindividuais, faz-se necessário construir soluções que vão se utilizar, a um só tempo, de algumas noções extraídas da responsabilidade civil, bem como de perspectiva própria do direito penal”.7 (Grifou-se)

Portanto, a par dessas premissas, vemos que uma das funções do dano moral coletivo é garantir a efetividade dos princípios da prevenção e precaução, com o intuito de propiciar uma tutela mais efetiva aos direitos difusos e coletivos, como no presente caso.

Neste ponto, a disciplina do dano moral coletivo se aproxima do direito penal, especificamente de sua finalidade preventiva, ou melhor, de prevenir nova lesão a direitos transindividuais.

A ideia de “punitive damages” vem sendo gradativamente aplicada no ordenamento jurídico nacional, a exemplo do disposto no Enunciado 379 da IV Jornada de Direito Civil, e do Resp 965500/ES:

Enunciado 379 – O art. 944, caput, do Código Civil não afasta a possibilidade de se reconhecer a função punitiva ou pedagógica da responsabilidade civil. (Grifou-se).

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO MOVIDA EM RAZÃO DE ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO CAUSADO POR “BURACO’ EM RODOVIA EM MAU ESTADO DE CONSERVAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO APURADA E RECONHECIDA, PELA SENTENÇA E PELO ACÓRDÃO, A PARTIR DE FARTO E ROBUSTO MATERIAL PROBATÓRIO. CONDENAÇÃO DO ESTADO AO PAGAMENTO DE PENSIONAMENTO VITALÍCIO E DANOS MORAIS. ALEGADA EXORBITÂNCIA DO VALOR INDENIZATÓRIO (DE R$ 30.000,00) E DE HONORÁRIOS (R$ 5.000,00).

DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO ÓBICE INSCRITO NA SÚMULA 7/STJ.

MANIFESTA LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO, ORA RECORRENTE. RECURSO ESPECIAL NÃO-CONHECIDO.

1. Trata-se de recurso especial (fls. 626/634) interposto pelo Estado do Espírito Santo em autos de ação indenizatória de responsabilidade civil e de danos morais, com fulcro no art. 105, III, “a”, do permissivo constitucional, contra acórdão prolatado pelo Tribunal Justiça do Estado do Espírito Santo que, em síntese, condenou o Estado recorrente ao pagamento de danos morais e pensão vitalícia à parte ora recorrida.

2. Conforme registram os autos, diversos familiares do autor, inclusive sua filha e esposa, faleceram em razão de acidente automobilístico causado, consoante se constatou na instrução processual, pelo mau estado de conservação da rodovia em que trafegavam, na qual um buraco de grande proporção levou ao acidente fatal ora referido. Essa evidência está consignada na sentença, que de forma minudente realizou exemplar análise das provas coligidas, notadamente do laudo pericial.
3. Em recurso especial duas questões centrais são alegadas pelo Estado do Espírito Santo: a – exorbitância do valor fixado a título de danos morais, estabelecido em R$ 30.000,00; b – inadequação do valor determinado para os honorários (R$ 5.000,00).

4. Todavia, no que se refere à adequação da importância indenizatória indicada, de R$ 30.000,00, uma vez que não se caracteriza como ínfima ou exorbitante, refoge por completo à discussão no âmbito do recurso especial, ante o óbice inscrito na Súmula 7/STJ, que impede a simples revisão de prova já apreciada pela instância a quo, que assim dispôs: O valor fixado pra o dano moral está dentro dos parâmetros legais, pois há eqüidade e razoabalidade no quantum fixado. A boa doutrina vem conferindo a esse valor um caráter dúplice, tanto punitivo do agente quanto compensatório em relação à vítima.

(…)
7. Recurso especial conhecido em parte e não-provido.

(REsp 965500/ES, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2007, DJ 25/02/2008 p. 1) (Grifou-se).

Inclusive, o próprio STJ já dá indícios de “overruling”, como se pode notar através do recente julgado sobre o tema, o REsp 1.057.274-RS:
DANO MORAL COLETIVO. PASSE LIVRE. IDOSO.
A concessionária do serviço de transporte público (recorrida) pretendia condicionar a utilização do benefício do acesso gratuito ao transporte coletivo (passe livre) ao prévio cadastramento dos idosos junto a ela, apesar de o art. 38 do Estatuto do Idoso ser expresso ao exigir apenas a apresentação de documento de identidade. Vem daí a ação civil pública que, entre outros pedidos, pleiteava a indenização do dano moral coletivo decorrente desse fato. Quanto ao tema, é certo que este Superior Tribunal tem precedentes no sentido de afastar a possibilidade de configurar-se tal dano à coletividade, ao restringi-lo às pessoas físicas individualmente consideradas, que seriam as únicas capazes de sofrer a dor e o abalo moral necessários à caracterização daquele dano. Porém, essa posição não pode mais ser aceita, pois o dano extrapatrimonial coletivo prescinde da prova da dor, sentimento ou abalo psicológico sofridos pelos indivíduos. Como transindividual, manifesta-se no prejuízo à imagem e moral coletivas e sua averiguação deve pautar-se nas características próprias aos interesses difusos e coletivos. Dessarte, o dano moral coletivo pode ser examinado e mensurado. Diante disso, a Turma deu parcial provimento ao recurso do MP estadual. REsp 1.057.274-RS, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 1º/12/2009. (Grifou-se)

Dessa forma, pode-se concluir que os danos causados à coletividade devem ser ressarcidos pela COMPRA FÁCIL. Quanto aos danos materiais, que sejam ressarcidos com base na ideia de reparação dos prejuízos causados, e quanto aos danos morais, que sejam ressarcidos com base tanto na ideia de reparação como de punição.

e) Danos individuais homogêneos

Vale ressaltar que a conduta ilícita da COMPRA FÁCIL foi capaz de gerar não só danos coletivos, como também danos individuais homogêneos.

Diz-se isso, pois no presente caso há interesses divisíveis de um grupo de pessoas determinadas ou determináveis, de origem comum, e oriundo das mesmas circunstâncias de fato, que foram violados (art. 81, III, CDC).

Em outras palavras, a não entrega de mercadorias no prazo estipulado, ou a entrega de bens defeituosos gerou danos diferenciados e individuais a cada consumidor da COMPRA FÁCIL.

Assim, é possível que haja moradores que tenham comprado bens para dar em uma data comemorativa específica, enquanto que outros tenham comprado bens substitutos.

Enfim, de acordo com as circunstâncias, houve prejuízos materiais e moral aos consumidores que devem ser ressarcidos pela COMPRA FÁCIL.

Já é tema consolidado na jurisprudência que um único ato pode ferir, ao mesmo tempo, direitos naturalmente coletivos (difusos e coletivos propriamente ditos) e direitos acidentalmente coletivos (individuais homogêneos). E é exatamente o que ocorre no caso em voga.

Por essa razão, deve-se aplicar o princípio do máximo benefício da tutela coletiva, que encontra fundamento no art. 103, § 3º do CDC.

Para materialização do princípio do máximo benefício, a COMPRA FÁCIL deve, no bojo da ação civil pública, ser condenada a indenizar as vítimas pelos danos provocados, sejam eles coletivos, ou individuais homogêneos.

Não se pode negar que os efeitos de eventual sentença condenatória em ação civil pública são ultra partes, permitindo aos consumidores titulares do direito violado a indenização individual pelos danos causados pela ré.

Assim, em sede de ação civil pública, deverá a ré ser condenada ao ressarcimento desses consumidores, ao passo que o CDC expressamente determina a responsabilidade civil por danos causados aos consumidores individualmente considerados. Por esse motivo, preconiza o art. 6º, VI do CDC:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; (grifou-se).

Ademais, a possibilidade de indenização individual em sede de ação civil pública é intrínseca ao processo coletivo. Nesse sentido, vale citar novamente o esclarecedor precedente do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TELEFONIA MÓVEL. CLÁUSULA DE FIDELIZAÇÃO. DIREITO CONSUMERISTA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ARTS. 81 E 82, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 129, III, DA CF. LEI COMPLEMENTAR N.º 75/93.

ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO OU QUAISQUER DOS ENTES ELENCADOS NO ARTIGO 109, DA CF/88. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.

ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DO ARTIGO 273, DO CPC. SÚMULA 07/STJ. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA.

VIOLAÇÃO DO ART. 535, I e II, DO CPC. NÃO CONFIGURADA.

1. O Ministério Público ostenta legitimidade para a propositura de Ação Civil Pública em defesa de direitos transindividuais, como sói ser a pretensão de vedação de inserção de cláusulas de carência e fidelização, que obrigam a permanência do contratado por tempo cativo, bem como a cobrança de multa ou valor decorrente de cláusula de fidelidade (nos contratos vigentes) celebrados pela empresa concessionária com os consumidores de telefonia móvel, ante a ratio essendi do art. 129, III, da Constituição Federal, arts. 81 e 82, do Código de Defesa do Consumidor e art. 1º, da Lei 7.347/85.

Precedentes do STF (AGR no RE 424.048/SC, DJ de 25/11/2005) e S.T.J (REsp 806304/RS, PRIMEIRA TURMA, DJ de 17/12/2008; REsp 520548/MT, PRIMEIRA TURMA, DJ 11/05/2006; REsp 799.669/RJ, PRIMEIRA TURMA, DJ 18.02.2008; REsp 684712/DF, PRIMEIRA TURMA, DJ 23.11.2006 e AgRg no REsp 633.470/CE, TERCEIRA TURMA, DJ de 19/12/2005).

2. In casu, a pretensão veiculada na Ação Civil Pública ab origine relativa à vedação de inserção de cláusulas de carência e fidelização, que obrigam a permanência do contratado por tempo cativo, bem como a cobrança de multa ou valor decorrente de cláusula de fidelidade (nos contratos vigentes) celebrados pela Concessionária com os consumidores de telefonia móvel, revela hipótese de interesses nitidamente transindividuais e por isso apto à legitimação do Parquet.

(…)
7. Deveras, o Ministério Público está legitimado a defender os interesses transindividuais, quais sejam os difusos, os coletivos e os individuais homogêneos.

8. Nas ações que versam interesses individuais homogêneos, esses participam da ideologia das ações difusas, como sói ser a ação civil pública. A despersonalização desses interesses está na medida em que o Ministério Público não veicula pretensão pertencente a quem quer que seja individualmente, mas pretensão de natureza genérica, que, por via de prejudicialidade, resta por influir nas esferas individuais.

9. A assertiva decorre do fato de que a ação não se dirige a interesses individuais, mas a coisa julgada in utilibus poder ser aproveitada pelo titular do direito individual homogêneo se não tiver promovido ação própria.

(…)
20. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.

(REsp 700.206/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/03/2010, DJe 19/03/2010). (grifou-se).

Por todo o exposto, a COMPRA FÁCIL deverá ressarcir os consumidores pelos prejuízos que comprovarem em sede de liquidação, na forma dos artigos 91 e 97, todos da Lei 8.078/90.

f) Os pressupostos para o deferimento da liminar

Ao se analisar os fatos descritos no capítulo II, fica patente perceber a presença dos pressupostos para o deferimento da liminar pretendida, quais sejam, (i) a fumaça do bom direito (“fumus boni iuris”); e (ii) o perigo da demora (“periculum in mora”).

O fumus boni iuris se faz presente, uma vez que a COMPRA FÁCIL inegavelmente deixou de entregar, por diversas vezes, os produtos devidamente pagos pelos consumidores, desde 2009 até os dias atuais, e sem qualquer justificativa plausível.

Isso fica nítido, quando se observa as diversas reclamações dos consumidores da COMPRA FÁCIL feitas na Ouvidoria do Ministério Público. Todos alegam que ou a empresa não entrega os produtos vendidos dentro do prazo estipulado por falta de mercadoria em estoque, ou entregam bens defeituosos, ou anuncia produtos a um valor num meio de comunicação e outro e num segundo, aceitando vender somente o de valor mais alto, dentre outras.

Logo, não há dúvidas de que o desenvolvimento do objeto social da COMPRA FÁCIL revela-se ilegal, uma vez que baseado em atitudes completamente contrárias a CF, ao CDC e ao CC.

Nesse contexto, o periculum in mora torna-se evidente, uma vez que é inegável o grave risco de dano aos consumidores. Perceba que o serviço prestado pela COMPRA FÁCIL envolve o fornecimento de bens no meio de comunicação mais intenso em consumo, qual seja: a internet. A sua comercialização em escala acarreta danos irreparáveis, ou no mínimo, de difícil reparação não só aos consumidores diretos do serviço, como também de toda a coletividade.

Isso porque, como já aludido, a venda de produtos que não estão presentes no estoque geram prejuízo financeiro ao comprador e prejuízo moral ao receptor do bem adquirido (como é o caso descrito no capítulo I da criança carente que não recebeu a bicicleta na noite de Natal).

Vê-se, portanto, que o presente juízo deve urgentemente e de forma imediata intervir no caso concreto para fazer cessar a prática ilícita, abusiva e danosa da COMPRA FÁCIL.

IV. PEDIDO LIMINAR

Ante o exposto, o Ministério Público do Rio de Janeiro requer liminarmente e sem a oitiva da parte contrária que a ré (i) cumpra, em todos os seus contratos de compra e venda, o prazo estipulado para a entrega de seus produtos; (ii) se abstenha de divulgar, em todas as suas ofertas publicitárias, sobretudo nos sites de venda, produtos e serviços que não estejam em estoque, ou quando divulgados nessas condições, faça constar e forma clara e destacada, para que o consumidor possa fácil e imediatamente a informação de que o produto esta indisponível no estoque; (iii) venda produtos de acordo com as informações divulgadas nos anúncios publicitários; e (iv) realize um serviço de pós venda mais eficaz e veloz ao consumidor; tudo isso sob pena de multa diária de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

V. PEDIDOS PRINCIPAIS

Requer ainda o Ministério Público que:

a) após apreciado liminarmente e deferido, seja julgado procedente o pedido formulado em caráter liminar;

b) seja a COMPRA FÁCIL condenada a cumprir com as seguintes obrigações de fazer, sob pena de multa diária de R$ 20.000,00 (vinte mil reais): (i) cumpra, em todos os seus contratos de compra e venda, o prazo estipulado para a entrega de seus produtos; (ii) se abstenha de divulgar, em todas as suas ofertas publicitárias, sobretudo nos sites de venda, produtos e serviços que não estejam em estoque, ou quando divulgados nessas condições, faça constar e forma clara e destacada, para que o consumidor possa fácil e imediatamente a informação de que o produto esta indisponível no estoque; (iii) venda produtos de acordo com as informações divulgadas nos anúncios publicitários; e (iv) realize um serviço de pós venda mais eficaz e veloz ao consumidor;

c) seja a COMPRA FÁCIL condenada a indenizar, da forma mais ampla e completa possível, os danos materiais e morais causados aos consumidores individualmente considerados, como estabelece o art. 6º, VI do CDC, em virtude da conduta aqui tratada;

d) seja a COMPRA FÁCIL condenada a reparar os danos morais causados aos consumidores, considerados em sentido coletivo, no valor mínimo de R$ 100.000,00 (cem mil reais), corrigidos e acrescidos de juros, cujo valor reverterá ao Fundo de Reconstituição de Bens Lesados, mencionado no art. 13 da Lei n° 7.347/85;

e) seja publicado o edital ao qual se refere o art. 94 do CDC;

f) seja citada a COMPRA FÁCIL para que, querendo, apresente contestação, sob pena de revelia;

g) seja condenada a ré ao pagamento de todos os ônus da sucumbência, incluindo os honorários advocatícios.

Além disso, protesta o Ministério Público, nos termos do art. 332 do Código de Processo Civil, pela produção de todas as provas admissíveis no Direito, sob pena de confissão, sem prejuízo da inversão do ônus da prova previsto no art. 6o, VIII, do Código de Defesa do Consumidor.

O Ministério Público esclarece, ainda, que a presente está acompanhada dos autos originais do IC nº 063/2009 da 4ª PJDC (195 laudas).

Dá-se a esta causa, por força do disposto no art. 258 do Código de Processo Civil, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Rio de Janeiro, 13 de outubro de 2010.

PEDRO RUBIM BORGES FORTES
Promotor de Justiça
1 http://www.comprafacil.com.br/comprafacil/pages/atendimento/quemSomos.jsf
2 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 21a ed. 2008, p. 53.

3 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 21a ed. 2008, p.55.

4 Cf. MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 21a ed. 2008, p. 56.

5 http://www.comprafacil.com.br/comprafacil/pages/loja/loja.jsf
6 BESSA, Leonardo Roscoe. Dano moral coletivo. In Revista de Direito do Consumidor nº 59/2006.

7 BESSA, Leonardo Roscoe. Dano moral coletivo. In Revista de Direito do Consumidor nº 59/2006.

http://www.tj.rj.gov.br/scripts/weblink.mgw?MGWLPN=DIGITAL1A&PGM=WEBJRP104xLCI&LAB=LEDxWEB&PORTAL=1&PRO=20100012895328&FORMA=1&SEF=1&JOB=25746&PAL=HERMES&CNJ=20100012895328^N

 
JUÍZO DE DIREITO DA 4ª VARA EMPRESARIAL DA COMARCA DA CAPITAL Processos nº: 0320280-62.2010.8.19.0001 DECISÃO Rejeito os embargos interpostos pelo Ministério Público, eis que o despacho embargado não possui qualquer conteúdo decisório, servindo apenas para impulsionar o feito. Assim, afigura-se incabível a via dos embargos de declaração. Quanto ao pedido de antecipação de tutela, cabe salientar que consta dos autos a referência a várias reclamações formuladas por terceiros que se afirmam lesados, indicando tal fato que a instituição demandada vem, muito provavelmente e com grande freqüência, descumprindo direitos de consumidores quando do fornecimento de produtos. Denota-se, com efeito, que o conjunto probatório permite concluir pela presença da verossimilhança nas alegações expendidas pela parte autora, valendo, outrossim, mencionar que o elevado número de reclamações indica que o fato assinalado não consiste em situações isoladas. O perigo de dano para os consumidores é evidente, pois os mesmos ficam privados dos produtos ou de seu uso regular, somente sendo atendidos após reclamação para os órgãos de defesa de consumidores, quando o são. Assim, defiro, em todos os seus termos, a antecipação de tutela, cominando, para a hipótese de descumprimento da presente decisão, pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Intime-se. Rio de Janeiro, 29 de junho de 2011.

Faça seu comentário (2)

Comentado por magna em 18/8/11

Bom dia!
Por gentileza, eu também estou com problemas com o site do Compra Facil. Fiz uma compra desde o dia 01/08/2011 e até agora não recebi a minha mercadoria, e o pior é que eles não sabem o que dizer. Cada ligação é uma enrolação.
Me ajudem por favor, como devo proceder, quem devo procurar.

Moro em São Paulo, SP.

Magna A M Queiroz

Comentado por magna em 18/8/11

Bom dia!
Por gentileza, eu também estou com problemas com o site do Compra Facil. Fiz uma compra desde o dia 01/08/2011 e até agora não recebi a minha mercadoria, e o pior é que eles não sabem o que dizer. Cada ligação é uma enrolação.
Me ajudem por favor, como devo proceder, quem devo procurar.

Magna A M Queiroz

Site publicado em 04/05/2009
www.flaviocitro.com.br - siteflaviocitro.com.br